Uma amiga me perguntou alguns dias atrás algumas coisas relacionadas às iniciações. O que é exatamente essa "iniciação"? E como saber em que ponto de nossa evolução estamos? Minha dificuldade em responder de forma objetiva me levou a uma pequena pesquisa, que resumo aqui.
O que é uma iniciação?
Por muitos anos fui professor de reiki, uma forma de terapia alternativa baseada na imposição de mãos. No reiki, é dada uma ênfase - talvez inadequada - no processo de iniciação, que transformou a versão ocidental do sistema em um tipo de "sucessão apostólica". Passando ao largo do bastante polêmico tema das iniciações de reiki, vou me ater ao que se busca nelas: uma sintonização dos centros energéticos do iniciando à um determinado padrão vibratório, que permite a canalização de forma livre e desimpedida, por meio de técnicas bastante simples, de uma energia de cura. É portanto um ritual voltado à manipulação e "reconfiguração" dos corpos de nossa personalidade - físico, astral e mental - , e não implica ou representa de forma alguma evolução espiritual. Além disso, a iniciação em reiki é "ofertada" ao iniciando, independente de qualquer trabalho anterior realizado por este. Ela não demarca uma conquista do aluno, e sim uma ferramenta recebida por ele. Essa combinação de fatores - simplicidade e não exigência de qualquer trabalho preparatório - contribuiu para que a versão ocidental do reiki fosse distorcida e mercantilizada em níveis assustadores.
No livro "Iniciação Humana e Solar", Djwal Khul nos fala bastante a respeito das iniciações, com um foco completamente diferente. Vou colocar e comentar alguns trechos, traduzidos do original.
Iniciação envolve cerimônia. Este é o aspecto que tem sido enfatizado nas mentes dos homens, talvez um pouco em detrimento do seu verdadeiro significado. Primariamente ela envolve a capacidade de ver, escutar, e compreender, e sintetizar e correlacionar conhecimento. Ela não necessariamente envolve o desenvolvimento de faculdades psíquicas, mas envolve a compreensão interna que enxerga o valor subjacente à forma, e reconhece o propósito das circunstâncias à nossa volta. É a capacidade que sente a lição a ser aprendida de qualquer ocorrência e evento, e que por meio dessas compreensões e reconhecimentos provoca um crescimento e expansão a cada hora, semana, ano. Este processo de expansão gradual - o resultado de um esforço bem definido e da árdua manutenção do pensamento e vida corretos por parte do aspirante, e não de algum professor oculto realizando um oculto ritual - leva àquilo que poderíamos denominar de crise.
Logo no início desse trecho, DK nos alerta que o foco no rito nos induz ao erro. E diz que embora a iniciação não envolva o desenvolvimento de faculdades psíquicas, ela demanda uma sensibilidade e articulação mental consideráveis por parte do iniciando. Essa sensibilidade e capacidade de aprendizado aplicadas de forma intensa e constante gera de forma gradual, porém inexorável, um crescimento que leva o iniciando a um momento de "crise".
O que é essa crise? Uma forma de entendê-la é lembrando das histórias de monges budistas, que instigavam seus alunos a pensarem intensamente, durante dias, em alguma pergunta aparentemente sem solução, e no momento máximo de tensão faziam algum comentário que os levava a compreender a verdadeira natureza do ensinamento pretendido.
É importante notar que a intervenção do mestre seria inútil sem todo o esforço do aluno. E talvez ela nem fosse necessária. Talvez após algum tempo o aluno conseguisse se desvencilhar do estado de tensão e perceber o ensinamento. Mas vale a pena citar Yogananda: "Se, perdido em uma floresta, alguém se oferecesse para guiá-lo em segurança, recusaria sua ajuda? Decerto poderia encontrar a saída sozinho - ou passar o resto de sua vida tentando. Sem saber pilotar, recusaria a ajuda de um piloto para conduzí-lo em segurança até seu destino?"
DK prossegue em seu livro dizendo:
Nesta crise, que demanda a ajuda de um Mestre, um ato definido de iniciação é praticado, que (agindo em um centro em particular) produz um resultado em algum corpo. Sintoniza os átomos em um determinado tom, e permite que uma nova frequência seja atingida.
Esta cerimônia de iniciação marca um ponto de realização. Ela não traz a realização, como é tão frequentemente mal compreendida. Ela simplesmente marca o reconhecimento pelos Instrutores alertas da raça de um ponto bem definido na evolução alcançada pelo pupilo, e proporciona duas coisas:
1. Uma expansão de consciência que admite a personalidade à sabedoria obtida pelo Ego, e nas iniciações mais altas à consciência da Mônada.
2. Um breve período de iluminação onde o iniciando vê a porção do Caminho a ser trilhado diante dele, e onde compartilha conscientemente do grande plano de evolução.
Após a iniciação, o trabalho a ser feito consiste grandemente em tornar aquela expansão de consciência parte do equipamento de uso prático da personalidade, e em dominar a porção do caminha que ainda tem que ser percorrida.
Deste trecho, considero importante duas coisas: a iniciação não nos traz por si própria iluminação ou qualquer tipo de crescimento. Porém ela é um marco importante desse crescimento. Como no caso do monge budista, o ato praticado na iniciação resolve o momento de crise de forma que o potencial acumulado seja liberado. Segundo, a iniciação não torna as pessoas "iluminados permanentes". A iluminação nos permite ver o caminho a ser trilhado, porém não funcionamos adequadamente, do ponto de vista de nossas atividades cotidianas, nesse estado de consciência. No dia a dia, nosso cérebro precisa estar focado quase inteiramente no plano físico. Mas temos que trabalhar para que possamos nos aproximar desse estado quando necessário, e de forma intencional.
É de suma importância, nesse momento, cristalizar a diferença entre a iniciação de reiki comentada no inicio do texto - que se relaciona com tantas outras com que nos deparamos em nossa caminhada - e a iniciação da qual DK nos fala.
Na iniciação de reiki, as alterações são provocadas pela manipulação por parte do instrutor (ou de outras entidades através do instrutor, como se aprende em alguns sistemas) dos centros energéticos do aluno, e ocorre nos corpos da personalidade. Na iniciação relatada por DK, as alterações são provocadas pela liberação do potencial acumulado pelo próprio aluno, e:
A cerimônia de iniciação se realiza nos três subplanos mais altos do plano mental e nos três planos superiores, conforme a iniciação.
Ou seja, elas se aplicam ao ciclo evolutivo do Ego, ou mesmo da Mônada, e não da personalidade. Consequentemente, ao contrário das iniciações de reiki seus efeitos perduram ao longo de toda a evolução daquele Ego em particular. Caso o leitor não tenha conhecimento do mecanismo reencarnatório, cabe dizer que os veículos de expressão físico, astral e mental (inferior) são criados para uma encarnação específica, e descartados ao final desta. Os corpos mental (superior), búdico e átmico são veículos de expressão do Ego, e portanto "sobrevivem" à morte da personalidade. O livro "O corpo causal e o ego", de Arthur Powell, trata extensivamente deste assunto.
Uma coisa que deve ser compreendida é que cada iniciação promove uma unificação maior entre personalidade e Ego, e posteriormente com a Mônada. Implica portanto na progressiva combustão de tudo que separa os corpos de expressão. Isso se inicia com as telas etéricas que separam os corpos da personalidade, e passa - na quarta iniciação, alegoricamente chamada de "crucificação" - pela destruição do corpo causal. Nossa consciência, dessa forma, progressivamente se funde à do Ego e à da Mônada.
Essa fusão da consciência com outros planos é um conceito difícil de absorver. Mas já vivenciamos ela parcialmente em nosso dia a dia, em menor escala. Somos o tempo inteiro assaltados por impressões emocionais (astrais) e mentais. Embora não tenhamos consciência simultânea nesses planos, nossa consciência já consegue lidar com as impressões recebidas do astral e mental enquanto age por via do corpo físico de forma tão natural que faz muitos duvidarem da própria existência dos planos onde essas impressões se originam. Podemos extrapolar esse conceito e imaginar, para fins didáticos, que futuramente estaremos lidando com impressões búdicas e átmicas da forma como hoje lidamos com as impressões astrais e mentais, e que nesse momento o mundo astral e o mundo físico serão vivenciados como uma coisa única.
Quanto a segunda pergunta: como saber em que ponto da evolução nos encontramos?
Existe uma resposta simplista, que é "não temos como saber". Do ponto de vista de personalidades ainda não integradas, pouco podemos captar do que diz respeito ao progresso de nossa alma. Mas podemos fazer algumas suposições com base nos livros de DK. Por exemplo, no próprio livro citado acima, "Iniciação Humana e Solar", é dito que na quarta iniciação ocorre a destruição do corpo causal, com o foco de nossa consciência se transferindo para o Ego. Considerando nossa dificuldade em dominar até mesmo nosso corpo emocional, podemos ter alguma segurança de que não estamos nesse ponto.
No livro "Cura Esotérica", temos pistas bastante fortes de que também não passamos pela terceira iniciação. Falando do processo de integração entre alma e personalidade, em um dado momento DK diz que após o homem passar a funcionar como uma personalidade integrada, ele ainda vivencia três fases distintas, da qual a segunda é
Uma fase de transição em que um conflito se inicia entre a personalidade e a alma. A alma começa a buscar liberação da forma de vida e, - em última análise - a alma é dependente desse princípio de vida, conferido pela alma. Colocando em outras palavras, o conflito entre o raio da alma e o raio da personalidade começa, e a guerra se desenrola entre esses dois aspectos de energia. Este conflito termina na terceira iniciação.
Além disso, cabe lembrar que a dois mil anos atrás uma outra personalidade, já tendo passado pela terceira iniciação, atingiu a quarta iniciação através da crucificação. Provavelmente não estamos no mesmo ponto em que ela estava.
Mas o que provavelmente é a pista mais clara de onde nos situamos está no livro "Os raios e as iniciações". Nele, ao falar das 14 regras da iniciação grupal, nos diz que não é necessário que todos os membro do grupo sejam iniciados ao mesmo tempo, ao responder a uma dúvida hipotética sobre a possibilidade de um indivíduo "atrasar" a evolução do grupo a que pertence. E ele prossegue:
Basicamente, o que estou querendo dizer a respeito dessas regras tem relação com a terceira iniciação - a iniciação da personalidade integrada. Todavia, elas necessariamente tem uma relação com a segunda iniciação, e são consequentemente de maior interesse geral, pois esta é a iniciação que se apresenta a tantos aspirantes hoje - a demonstração de controle da formidável natureza emocional.
Imagino que podemos nos colocar então como personalidades em busca da segunda, ou quando muito da terceira iniciação, que corresponde a primeira grande iniciação. Mas independente do interesse intelectual que esse tipo de informação carrega, não acredito que o tempo gasto tentando nos situar em relação ao ponto de evolução em que nos encontramos seja produtivo - para não dizer que seja contraprodutivo. E DK nos dá inúmeras lições de humildade em seus livros. Por exemplo, a terceira iniciação é buscada pelo que ele denomina de personalidades já integradas, ou por homens que já podem se autodenominar "personalidades reais".
Nesse sentido, deixo como despedida um trecho do livro "Cura Esotérica" cujo significado deveria servir de alerta - e motivação - para todos nós.
Existem hoje no mundo muitas personalidades verdadeiramente integradas. Elas, por causa dessa integração entre alma e personalidade, podem trilhar o Caminho do Discípulo Aceito. Este é um desdobramento bastante útil, se você puder entender suas implicações e significado, e surge a questão de como outros que ainda estão no processo de reorientação podem desenvolver uma integração adequada da personalidade. Eles nunca conseguirão se depreciarem ou superestimarem a si mesmos. Muitos tendem a se considerar como personalidades por causa de sua boa vontade natural, ou porque são estudantes do oculto. Eles se esquecem de que um estudante do oculto é um que está em busca do que está escondido - no seu caso daquele fio integrador escondido que permitirá fundir os três corpos e desta forma verdadeiramente merecer o nome de personalidade. Alguns deles não podem se tornar personalidades nesta vida, mas eles podem desenvolver o conceito mental desta possibilidade e sua natureza; eles precisam lembrar que "como um homem pensa em seu coração, assim ele é.". Isto não é uma perda de tempo, mas um processo muito necessário e um pelo qual todos os Membros da Hierarquia já passaram.
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