O dogma do diabo e da redenção

Enviado por Estante Virtual em sab, 24/11/2012 - 00:38

Esse dogma do Diabo e da redenção parece ter sido baseado em duas passagens do Novo Testamento: "Para destruir as obras do Diabo é que o Filho de Deus veio ao mundo". "E então houve no céu uma guerra; Miguel e os seus anjos pelejavam contra o Dragão e o Dragão com os seus anjos pelejavam e não prevaleceram; nem o seu lugar se achou mais no céu. E foi banido o grande Dragão, aquela velha serpente, chamada Diabo e Satã, que seduz a todo o mundo". Que nos seja permitido, então, explorar as teogonias antigas, a fim de verificar o que significavam essas expressões notáveis.

A primeira indagação refere-se ao fato de saber se o termo Diabo, tal como usado aqui, representa atualmente a maligna Divindade dos cristãos, ou uma força antagônica, cega - o lado escuro da Natureza. Com esta última expressão não queremos dizer que a manifestação de qualquer princípio do mal é malum in se, mas apenas a sombra da Luz, por assim dizer. As teorias dos cabalistas tratam dela como uma força que é antagônica, mas ao mesmo tempo essencial para a vitalidade, a evolução e o vigor do princípio do bem. As plantas poderiam perecer em seu primeiro estágio de existência se fossem exposta a um luz solar constante; a noite que alterna com o dia é essencial ao seu crescimento saudável e ao seu desenvolvimento. O bem, da

mesma maneira, deixaria rapidamente de sê-lo se não alternasse com seu oposto. Na natureza humana, o mal denota o antagonismo da matéria com o que é espiritual, e assim eles se purificam mutuamente. No cosmos, o equilíbrio deve ser preservado; a operação dos dois contrários produz a harmonia, tais como as forças centrípeta e centrífuga, e uma é necessária à outra. Se um delas cessar, a ação da outra se tornará destrutiva imediatamente.

A personificação denominada Satã, deve ser contemplada de três planos diferentes: o Velho Testamento, os padres cristãos e a antiga atitude gentia., Supõe-se que ele fosse representado pela Serpente do Jardim do Éden; não obstante, o epíteto de Satã não se aplica, em nenhum dos escritos sagrados hebraicos, nem a essa, nem a qualquer outra variedade de ofídios. A Serpente de Bronze foi adorada pelos israelitas como um deus, porque era o símbolo de Esmun-Asklepius, o Iao fenício. Na verdade, o caráter do próprio Satã é apresentado no Primeiro Livro de Crônicas, instigando Davi a contar o povo israelita, um ato depois declarado como tendo sido ordenado pelo próprio Jeová a inferência inevitável é a de que os dois, Satã e Jeová, eram tidos como idênticos.

Nas profecias de Zacarias encontra-se outra menção a Satã. Esse livro foi escrito num período posterior à colonização da Palestina e, por essa razão, pode-se supor que os assideus devem ter trazido diretamente do Oriente essa personificação. É bastante conhecido o fato de que esse corpo de sectários estava profundamente imbuído das noções mazdeístas e que representava Ahriman ou Angra-Mainyur pelos deuses-nomes da Síria. Set ou Set-an, o deus dos hititas e dos hicsos, e Beeel-Zebub, o oráculo-deus, mais tarde o Apolo grego. O profeta iniciou os seus trabalhos na Judéia, no segundo ano de Darius Hystaspes, o restaurador da adoração mazdeísta. Eis como ele descreve o encontro com Satã: "Depois mostrou-me o Senhor o sumo-sacerdote Jesus, que estava diante do anjo do Senhor, e Satã estava à sua direita para ser seu adversário. E o Senhor disse a Satã "O Senhor te reprima, ó Satã; e reprima o Senhor, que elegeu a Jerusalém! Acaso não é este um tição que foi tirado ao fogo?"

Percebemos que essa passagem, que citamos, é simbólica. Há duas alusões no Novo Testamento que indicam que assim deve ser. A Espístola Católica de Judas refere-se a isso com os seguintes termos: "Quando o arcanjo Miguel, disputando com o Diabo, altercava sobre o corpo de Moisés, não se atreveu a fulminar-lhe a sentença de blasfemo, mas disse 'O Senhor te reprima'". Vemos aqui o arcanjo Miguel mencionado como idêntico ao Senhor, ou anjo do Senhor, da citação anterior, e demostra-se assim que o Jeová hebraico tem um caráter duplo, o secreto e o manifestado como o anjo do Senhor, ou o arcanjo Miguel. Uma comparação entre essas duas passagens deixa claro que "o corpo de Moisés" sobre o qual alternavam era a Palestina, que, como "a terra dos hitias", era o domínio peculiar de Seth, seu deus tutelar. Miguel, o paladino da adoração de Jeová, lutou com o Diabo ou Adversário, mas deixou o julgamento ao seu superior.

Belial, não deve ser considerado, nem como deus, nem como diabo. O termo BELIAL, é definido nos léxicos hebraicos como destruição, assolamento, esterilidade; a frase AISH-BELIAL ou homem-Belial significa um homem destruidor, daninho. Se Belial deve ser personificado para agradar nossos amigos religiosos, seríamos obrigados a fazê-lo distinto de Satã e a considera-lo como uma espécie de Diakka espiritual. Os demonógrafos, todavia, que enumeram nove ordens distintas de daimonia, fazem-no chefe da terceira classe - um conjunto de duendes, nocivos e imprestáveis.

Asmodeu tem origem puramente presa, não é nenhum espírito judaico. Bréal, autor de Hercule et Cacus, mostra que ele é o Eshem-daêva, o espírito maligno da concupiscência, de quem Max Müller nos diz ser "mencionado muitas vezes no Avesta como um dos devas", originalmente deuses, que se tornaram espíritos do mal.

Samuel é Satã; mas Bryant e outras autoridades demonstram ser ele o nome de Simoom - o verbo do deserto, e o Simmom é chamado Atabul-os ou Diabolos.

Plutarco observa que por Typhon se deve entender alguma coisa violenta, ingovernável e desregrada. O transbordamento do Nilo era chamado pelos egípcios de Typhon. O Baixo Egito é muito plano e quaisquer morretes erguidos ao longo do rio para evitar as inundações freqüentes eram chamados Typhonian ou Taphos; aí, a origem de Typhon. Plutarco, que era um grego rígido, ortodoxo, e que nunca foi conhecido como alguém que olhasse egípcios com muita simpatia, testemunha em seu Ísis e Osíris que, longe de adorarem o diabo (de que os cristãos os acusam), os egípcios mais desprezavam do que temiam Typhon. No seu símbolo de poder oposto e obstinado da natureza, acreditavam fosse ele uma divindade pobre, batida, semimorta. Assim, mesmo naquela remotíssima era, já havia pessoas ilustradas o bastante para não acreditarem num diabo pessoal. Como Typhon era representado em um de seus símbolos sob a figura de um asno, no festival dos sacrifícios em honra do sol, os sacerdotes egípcios exortavam os adoradores fiéis a não vestirem ornamentos de ouro sobre seus corpos para não alimentar com eles o asno!

 

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