Foi publicado a poucos dias aqui no site o livro "Aos Pés do Mestre", de Krishnamurti. Como a autoria do livro é fruto de constante debate ainda hoje, acho interessante fazer algumas considerações a respeito.
Ernest Wood, após travar contato com a versão ainda não publicada do livro, disse à Leadbeater que notara algumas "coisas curiosas" a respeito do manuscrito. O estilo era muito semelhante ao do próprio Leadbeater, e continha algumas sentenças idênticas às encontradas no livro "A Vida Interna", ainda não impresso na época. Leadbeater respondeu que isso era devido a ele estar presente na maior parte das instruções recebidas por Krishnamurti, e ter incorporado alguns ensinamentos em seus livros. Quanto ao estilo, disse ser normal que tivesse absorvido muito do estilo do Mestre após tantos anos sendo instruído por ele.
Wood preparou o livro e o enviou para publicação. A alegação de conter instruções diretas de um dos Mestres, dadas através de um garoto identificado como veículo do "Instrutor do Mundo" gerou uma certa comoção dentro da Sociedade Teosófica. É provável que apenas isso já bastasse para que o nome de Krishnamurti, Leadbeater (seu "descobridor") e Besant (sua tutora legal) fossem marcados por polêmicas. Mas o rompimento de Krishnamurti com a Ordem da Estrela no Oriente, formada ao seu redor visando preparar o caminho para o Instrutor do Mundo certamente colocou muita lenha na fogueira.
Leadbeater ser alvo de inúmeras críticas também contribuiu para aumentar a importância atribuída à questão da autoria do livro. Por exemplo, Wood foi um amigo pessoal de Leadbeater, e trabalhou com ele 10, 12 horas diárias durante muito tempo. Isso confere força a seguinte afirmação, feita por ele na edição de dezembro de 1964 do "American Theosophist" após enfatizar que o livro "As Vidas de Alcione" fora um trabalho quase exclusivo de Leadbeater:
"Eu também cheguei a conclusão de que o Sr. Leadbeater então, e em muitas outras ocasiões, estava em grande parte 'vendo suas próprias formas pensamento', e isso não somente de um ponto de vista teórico, mas baseado em evidências materiais"
Isso alude a um fenômeno infelizmente comum, em que as criações mentais do próprio clarividente se confundem com as demais formas percebidas por este, levando a erros que independem da sua sinceridade e boa vontade.
Passei por uma época em que essas divergências me incomodaram o suficiente para me levar a pesquisar o assunto, e "resolver a questão", ao menos de um ponto de vista pessoal. Li inúmeros artigos, mas a própria polêmica parece ter se tornado vazia. Wood, poucos anos após perder as eleições presidenciais da Sociedade Teosófica em 1934 chegou a dizer que sabia que o livro havia sido atribuído indevidamente à Krishnamurti, o que tornaria todos os envolvidos - Wood inclusive - mentirosos. Acabei me cansando do assunto, que em última análise é completamente improdutivo.
Entendo que colocar em dúvida a autoria do livro buscando atribuí-la à Leadbeater é fruto ou da tentativa de desacreditar a mensagem transmitida, associando-a a imagem polêmica de Leadbeater, ou de desvincular o livro de Krishnamurt, visto que ele não é completamente coerente com o estilo dos ensinamentos dados ao longo de sua vida adulta. Nenhuma das razões me parece digna de crédito.
A mensagem do livro, por si só, deveria ser suficiente para que sua leitura fosse incentivada - como o é, independente de qualquer polêmica, conforme atestam as inúmeras traduções e reedições. E não é a principal recomendação tanto da Sociedade Teosófica quanto de Djwal Khul que não aceitemos nada pela autoridade que acompanha o autor, e sim pelos méritos do ensinamento transmitido?
Vamos ler então a mensagem. E reler. Ela é simples, direta, como deveria ser todo ensinamento destinado a nos colocar no caminho iniciático, que um dia, por força de nossa natureza, nos levará a re-união que tanto atrai nossas personalidades.
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