Capítulo 6 - Após a Morte

Enviado por Estante Virtual em sex, 08/06/2012 - 19:17
A morte é o abandono do corpo físico; mas isso não faz maior diferença para o Ego do que o faz para um homem físico tirar um casaco. Tendo descartado seu corpo físico, o Ego continua a viver em seu corpo astral até que se tenha exaurido a força gerada por emoções e paixões a que tenha se permitido sentir durante a vida terrena. Quando isso tiver ocorrido, a segunda morte tem lugar; o corpo astral também se desprende dele, e ele se encontra vivendo no corpo mental e no mundo mental inferior. Nesta condição ele permanece até que as forças de pensamento geradas durante suas vidas física e astral tiverem se dissipado; então ele por sua vez larga o terceiro veículo e permanece uma vez mais como um Ego em seu próprio mundo, habitando seu corpo causal.
 
Não existe, portanto, nenhuma coisa como a morte do modo como é entendida costumeiramente. Há somente uma sucessão de estágios numa vida contínua – estágios vividos nos três mundos um após o outro. A distribuição de tempo entre estes três mundos varia muito à medida que o homem avança. O homem primitivo vive quase exclusivamente no mundo físico, passando só poucos anos no astral ao fim de cada uma de suas vidas físicas. Ao se desenvolver, a vida astral se torna mais longa, e à medida que o intelecto se expande nele, e ele se torna capaz de pensar, começa a despender um breve período também no mundo mental. O homem comum das raças civilizadas permanece mais tempo no mundo mental do que no físico e no astral; na verdade, quanto mais um homem evolui mais longa se torna sua vida mental e mais curta sua vida no mundo astral.
 
A vida astral é o resultado de todos os sentimentos que têm em si um componente do eu. Se tiverem sido diretamente egoístas, o levarão a condições muito desagradáveis no mundo astral; se, mesmo tingidos de pensamentos sobre o eu, tiverem sido bons e gentis o levarão a uma vida astral comparativamente mais agradável, ainda que limitada. Os seus pensamentos e sentimentos que tiverem sido inteiramente altruístas produzem seu resultado em sua vida no mundo mental; portanto aquela vida no mundo mental não pode ser senão bem-aventurada. A vida astral, que o homem tiver feito para si ou miserável ou comparativamente jubilosa, corresponde ao que os Cristãos chamam de Purgatório; a vida mental inferior, que é sempre inteiramente feliz, é o que é chamado de Céu.
 
O homem faz para si mesmo seus próprios Purgatório e Céu, e estes não são lugares, mas estados de consciência. O Inferno não existe; é só uma invenção da imaginação teológica; mas um homem que vive levianamente pode fazer para si um Purgatório bastante longo e desagradável. Nem o Purgatório nem o Céu podem jamais ser eternos, pois uma causa finita não pode originar um resultado infinito. As variações nos casos individuais são tão amplas que dar exemplos concretos pode ser um pouco enganador. Se tomarmos o homem comum do que chamamos classe média, cujo representante típico poderia ser um pequeno lojista ou vendedor, sua vida média no mundo astral seria talvez cerca de quarenta anos, e a vida no mundo mental cerca de duzentos. O homem de espiritualidade e cultura, de outro lado, poderia ter talvez vinte anos de vida no mundo astral e mil na vida celeste. Alguém que fosse especialmente desenvolvido poderia reduzir a vida astral para uns poucos dias ou horas, e passar mil e quinhentos anos no céu.
 
Não só a extensão destes períodos varia grandemente, mas as condições em ambos os mundos diferem muitíssimo. A matéria de que todos estes corpos são construídos não é matéria morta, mas viva, e este fato deve ser levado em conta. O corpo físico é construído de células, cada qual é uma pequena vida separada animada pela Segunda Emanação, que provém do Segundo Aspecto da Deidade. Estas células são de diferentes tipos e desempenham várias funções, e todos estes fatos devem ser levados em consideração se o homem desejar entender o trabalho de seu corpo físico e viver uma vida sadia nele.
 
A mesma coisa se aplica aos corpos astral e mental. Na vida celular que os permeia não há nada ainda que se assemelhe a uma inteligência, mas há um forte instinto sempre pressionando em direção ao que serve para seu desenvolvimento. A vida animando a matéria de que tais corpos são feitos está no arco exteriorizante da evolução, se movendo para baixo e para fora em direção à matéria, de modo que para ela progresso significa descer para formas mais densas de matéria, e aprender a expressar-se através delas. Para o homem, desenvolvimento é exatamente o oposto disto; ele já mergulhou fundo na matéria e agora está se elevando dela em direção à sua origem. Há por isso um constante conflito de interesses entre o homem interno e a vida que habita a matéria de seus veículos, porquanto a tendência desta é descer, mas a daquele é subir.
 
A matéria do corpo astral (ou antes a vida animando suas moléculas) deseja para sua evolução quaisquer ondulações que possa obter, dos mais variados tipos possíveis, e o mais grosseiras possível. O próximo passo em sua evolução será animar a matéria física e se acostumar a vibrações ainda mais lentas; e, como um degrau neste caminho, deseja as mais grosseiras das vibrações astrais. Ela não tem inteligência para planejar isso definidamente, mas seu instinto a ajuda a descobrir o modo mais fácil de procurá-las.
 
As moléculas do corpo astral estão constantemente mudando, assim como as do corpo físico, mas de qualquer maneira a vida na massa daquelas moléculas astrais tem, ainda que muito vago, um senso de si mesma como um todo – como um tipo de entidade temporária. Ela não sabe que é parte do corpo astral de um homem; é muito capaz de entender o que seja um homem; mas percebe de um modo cego que nas suas condições atuais recebe ondulações em número e intensidade muito maiores do que receberia se flutuasse longe na atmosfera. Se assim fosse, então ela captaria só ocasionalmente, e à distância, a radiação das paixões e emoções humanas; mas agora, que está bem no coração delas, não perde nenhuma, e as obtém na intensidade máxima. Portanto, sente-se em boa posição, e faz um esforço para mantê-la. Ela se sente em contato com algo mais refinado que ela – a matéria do corpo mental do homem; e passa a sentir que se pudesse coagir aquele algo mais fino a se envolver em suas próprias vibrações, elas seriam grandemente intensificadas e prolongadas.
 
Uma vez que a matéria astral é o veículo do desejo e a matéria mental é o veículo do pensamento, este instinto, quando traduzido em nossa linguagem, significa que se o corpo astral puder induzir-nos a pensar que nós queremos o que ele quer, será muito mais fácil de obtê-lo. Assim exerce uma leve mas constante pressão sobre o homem – do seu ponto de vista é uma espécie de fome, mas para o homem é uma tentação para aquilo que é mais bruto e indesejável. Se ele for um homem passional haverá uma suave mas constante pressão em direção à irritabilidade; se for um sensualista, uma igualmente constante pressão em direção à impureza.
 
Um homem que não entende isso usualmente comete um de dois erros: ou supõe ser o apelo de sua própria natureza, e destarte a considera como inerentemente má; ou ele pensa que a pressão vem de fora – como uma tentação de um demônio imaginário. A verdade reside entre os dois. A pressão é natural, não para o homem mas para o veículo que ele está usando; seu desejo é natural e correto para o veículo, mas daninho para o homem, e portanto é necessário que ele lhe resista. Se ele assim resiste, se declina em permitir-se aos sentimentos sugeridos a ele, as partículas nele que necessitam destas vibrações se tornam apáticas por falta de nutrição, e eventualmente atrofiam e se desprendem de seu corpo astral, e são substituídas por outras partículas, cuja freqüência de onda natural está mais de acordo com as que o homem habitualmente se permite em seu corpo astral.
 
Esta é a razão para aquilo que chamamos de apelos da natureza inferior durante a vida. Se um homem condescende com eles, tais apelos se tornam mais e mais fortes até que ele já não lhes pode resistir, e se identifica com eles – que é exatamente o que esta curiosa semi-vida nas partículas do corpo astral quer que ele faça.
 
Na morte do corpo físico esta vaga consciência astral se alarma. Ela percebe que sua existência como uma massa separada está ameaçada, e toma providências instintivas para defender-se e manter sua posição o mais possível. A matéria do corpo astral é de longe mais fluídica do que a do físico, e esta consciência apodera-se de suas partículas e as dispõe de modo a resistir ao deslocamento. Ela coloca as mais grosseiras e densas do lado de fora como um tipo de concha, e arranja as outras em camadas concêntricas, de modo que o corpo como um todo se torna tão resistente à fricção quanto sua constituição o permite, e pode portanto manter sua forma o mais possível.
 
Para o homem isso produz vários efeitos desagradáveis. A fisiologia do corpo astral é muito diferente da do físico; este último adquire suas informações de fora através de certos órgãos que são especializados para servirem de instrumentos para seus sentidos, mas o corpo astral não tem sentidos separados no sentido usual da expressão. O que para o corpo astral corresponde à visão é o poder de suas moléculas de responder a impactos de fora, que lhe advêm através de moléculas similares. Por exemplo, um homem possui em seu corpo astral matéria pertencente a todas as subdivisões do mundo astral, e é por causa disso que ele é capaz de “ver” objetos feitos de matéria de qualquer uma destas subdivisões.
 
Suponhamos um objeto astral feito de matéria da segunda e terceira subdivisões misturadas, um homem vivendo no mundo astral poderia perceber aquele objeto somente se na superfície de seu corpo astral houvesse partículas pertencentes à segunda e terceira subdivisões daquele mundo, que fossem capazes de receber e registrar as vibrações que aquele objeto originou. Um homem que pelo rearranjo de seu corpo pela vaga consciência de que falamos tivesse no exterior daquele veículo somente a matéria mais densa da subdivisão inferior, não poderia ser mais consciente do objeto que mencionamos do que nós somos conscientes dos gases que se movem ao nosso redor na atmosfera ou de objetos constituídos só de matéria etérica.
 
Durante a vida física a matéria do corpo astral humano está em constante movimento, e suas partículas circulam entre si quase como o fazem as da água fervente. Conseqüentemente em qualquer momento dado é praticamente certo que partículas de todas as variedades estarão representadas na superfície de seu corpo astral, e que portanto quando ele estiver usando seu corpo astral durante o sono ele será capaz de “ver” desse modo qualquer objeto astral que se aproxime dele.
 
Após a morte, se ele permitiu que o rearranjo ocorresse (o que por ignorância todas as pessoas comuns fazem) sua condição a este respeito será diferente. Tendo na superfície de seu corpo astral somente as partículas mais inferiores e grosseiras, ele pode receber impressões somente de partículas externas correspondentes; assim, em vez de ver o conjunto do mundo astral ao seu redor, ele só verá um sétimo dele, e o mais denso e mais impuro. As vibrações desta matéria mais pesada são expressões somente de sentimentos e emoções indesejáveis, e da classe menos refinada de entidades astrais. Portanto eduzimos disso que um homem nesta condição pode ver somente os habitantes indesejáveis do mundo astral, e pode sentir apenas suas influências mais desagradáveis e vulgares.
 
Ele está rodeado por outros homens cujos corpos astrais provavelmente serão de caráter muito ordinário; mas uma vez que ele só pode ver e sentir o que é mais baixo e rude neles, eles lhe aparecem como monstros de vício desprovidos de quaisquer características redentoras. Mesmo seus amigos não parecem mais ser como antes, porque agora ele está incapacitado de apreciar quaisquer das suas melhores qualidades. Sob estas circunstâncias pouco admira que ele considere o mundo astral um inferno; mas a culpa de modo algum pertence ao mundo astral, mas a si mesmo – primeiro por permitir-se tanto àquele tipo mais rude de matéria, e segundo, por deixar que aquela vaga consciência astral o dominasse e se dispusesse daquele modo especial.
 
O homem que tiver estudado estes assuntos recusará completamente ceder à pressão durante a vida ou permitir o rearranjo após a morte, e por conseguinte ele reterá seu poder de ver o mundo astral como um todo, e não só a sua parte mais crua e vil.
 
O mundo astral tem muitos pontos em comum com o físico; como o físico, apresenta aspectos diversos para pessoas diversas, e mesmo para a mesma pessoa em períodos diversos de sua trajetória. É o lar das emoções e pensamentos inferiores; as emoções são muito mais fortes naquele mundo do que neste. Quando uma pessoa está desperta não podemos jamais ver a parte maior de sua emoção; sua força se esvai ao pôr em movimento a matéria física mais densa do cérebro. Assim se vemos aqui um homem demonstrar afeição, o que podemos ver não é o todo de sua afeição, mas só aquela parte dela que restar depois de este outro trabalho ter sido feito. As emoções portanto avultam muito mais na vida astral do que na física. Elas de modo algum excluem o pensamento superior se forem controladas, de maneira que no mundo astral tanto como no físico um homem pode devotar-se ao estudo e ao auxílio aos outros, ou ele pode desperdiçar seu tempo e vagar inconseqüente.
 
O mundo astral se estende quase até a distância média da órbita da Lua; mas ainda que o todo de seus domínios só seja franqueado aos habitantes que não tenham permitido a redistribuição de sua matéria, a grande maioria permanece muito mais perto da superfície da Terra. A matéria das diferentes subdivisões daquele mundo se interpenetram com perfeita liberdade, mas há no conjunto uma tendência para a matéria mais densa assentar-se junto ao centro. As condições se assemelham muito às que obtemos num balde d´água que contém em suspensão diversos tipos de matéria de diferentes graus de densidade. Se a água for mantida sempre em movimento, os diferentes tipo de matéria se difundirão por toda ela; mas a despeito disso, a matéria mais densa é encontrada em maior quantidade mais perto do fundo. De modo que ainda que não devamos pensar nas várias subdivisões do mundo astral como ficando umas sobre as outras como camadas de uma cebola, não obstante é verdadeiro que a disposição comum da matéria daquelas subdivisões assume um caráter semelhante.
 
A matéria astral interpenetra a matéria física precisamente como se não estivesse ali, mas cada subdivisão da matéria física tem uma forte atração pela matéria astral da subdivisão correspondente. Daí se evidencia que cada corpo físico tem sua contraparte astral. Se eu tiver um copo de água sobre uma mesa, o copo e a mesa, sendo de matéria física em estado sólido, serão interpenetrados por matéria astral da subdivisão mais baixa. A água no copo, sendo líquida, é interpenetrada pela matéria astral da sexta subdivisão; enquanto que o ar que rodeia ambos, sendo matéria física em estado gasoso, é inteiramente interpenetrado pela matéria gasosa astral – isto é, a matéria astral da quinta subdivisão.
 
Mas assim como o ar, a água, o copo e a mesa são igualmente interpenetrados todo o tempo pela matéria física mais sutil que chamamos etérica, também todas as contrapartes astrais são interpenetradas pela matéria astral mais fina das subdivisões mais altas que correspondem à etérica. Mas mesmo o sólido astral é menos denso que o mais rarefeito dos éteres físicos.
 
O homem que se acha no mundo astral após a morte, se ele não tiver se submetido ao rearranjo da matéria de seu corpo, perceberá apenas pequena diferença da vida física. Ele pode flutuar em qualquer direção à vontade, mas na verdade ele usualmente fica nas vizinhanças a que está acostumado. Ele ainda é capaz de perceber sua casa, seu quarto, sua mobília, seus conhecidos, seus amigos. Os vivos, quando ignoram sobre os mundos superiores, supõem ter “perdido” aqueles que deixaram seus corpos físicos; mas os mortos em nenhum momento têm a impressão de que perderam os vivos.
 
Atuando como estão no corpo astral, os mortos já não podem ver os corpos físicos daqueles que deixaram para trás; mas vêem sim seus corpos astrais, e como na forma estes são exatamente iguais aos físicos, os mortos estão perfeitamente cientes da presença de seus amigos. Eles vêem cada um rodeado por um tênue ovóide de névoa luminosa, e se forem observadores, podem perceber várias outras pequenas alterações no ambiente; mas pelo menos lhes fica bem claro que não se foram para um céu ou inferno distantes, mas ainda permanecem em contato com o mundo que conhecem, ainda que o vejam de um ângulo um tanto diverso.
 
O morto tem o corpo astral de seus amigos vivos obviamente diante de si, portanto não pode pensar neles como perdidos; mas enquanto o amigo está desperto, o morto não será capaz de fazer impressão nenhuma sobre ele, pois a consciência do amigo então está no mundo físico, e seu corpo astral está sendo usado somente como uma ponte. O morto não pode, pois, comunicar-se com seu amigo, nem pode ler os pensamentos superiores de seu amigo; mas ele verá pela mudança de cor no corpo astral qualquer emoção que o amigo possa sentir, e com pequena prática e observação ele poderá facilmente aprender a ler todos aqueles pensamentos de seu amigo que têm em si algo de egoísmo ou desejo.
 
Quando o amigo cai no sono toda a situação se altera. Ele então também está consciente no corpo astral lado a lado com o morto, e podem se comunicar em todos os aspectos tão livremente como o poderiam durante a vida física. As emoções sentidas pelos vivos reagem fortemente nos mortos a quem amam. Se aqueles dão vazão à dor, estes não podem senão sofrer severamente.
 
As condições de vida após a morte são quase infinitas em sua variedade, mas podem ser imaginadas sem dificuldade por qualquer um que se dê ao trabalho de entender o mundo astral e considerar o caráter da pessoa em questão. Aquele caráter não é nem no menor grau alterado pela morte; os pensamentos, emoções e desejos do homem são exatamente os mesmo de antes. Ele é em todos os sentidos o mesmo homem, exceto pela ausência do corpo físico, e sua felicidade ou miséria dependem da extensão em que a perda do corpo físico o afeta.
 
Se seus desejos tiverem sido tais que necessitem de um corpo físico para sua gratificação, ele estará sujeito a sofrer bastante. Tal anseio se manifesta como uma vibração no corpo astral, e enquanto estamos ainda neste mundo sua força é na maior parte empregada em mover as pesadas partículas físicas. Portanto, o desejo é no mundo astral uma força muitíssimo maior do que no físico, e se o homem não tiver tido o hábito de controlá-lo, e se nesta nova vida não puder ser satisfeito, isso pode causar-lhe grandes e prolongados problemas.
 
Tomemos como exemplo os casos extremos de um bêbado e de um sensualista. Aqui temos uma paixão que foi forte o bastante para durante a vida física sobrepujar a razão, o bom senso e todos os sentimentos de decência e afeição familiar. Depois da morte o homem se encontra no mundo astral sentindo o apetite talvez cem vezes mais intensificado, e completamente incapaz de satisfazê-lo porque perdeu o corpo físico. Uma vida como esta é um verdadeiro inferno – o único inferno que há; pois ninguém o está punindo; ele está colhendo o resultado perfeitamente natural de sua própria ação. Gradualmente esta força de desejo se esgota, mas só à custa de terrível sofrimento para o homem, porque para ele cada dia parece um milênio. Ele não tem nenhuma medida de tempo como temos aqui no mundo físico. Ele o pode medir só por suas sensações. De uma distorção deste fato veio a idéia blasfema da danação eterna.
 
Muitos outros casos menos extremos que estes prontamente sugerirão a si mesmos, nos quais um anseio que não pode ser satisfeito prova ser uma tortura. Um caso mais banal é o de um homem que não tem nenhum vício em particular, como a bebida ou a luxúria, mas foi ligado inteiramente às coisas do mundo físico, e viveu uma vida devotada aos negócios ou a frívolas atividades sociais. Para ele o mundo astral é um local de aborrecimento; as únicas coisas por que anela já não lhe são possíveis, pois no mundo astral não há negócios a fazer, e, ainda que possa ter tanta companhia quanto deseje, a sociedade agora lhe é um assunto bem diferente, porque todas as imposturas sobre as quais usualmente está baseada já não são possíveis.
 
Estes casos, entretanto, são só a minoria, e para a maioria das pessoas o estado após a morte é muito mais feliz que a vida sobre a Terra. O primeiro sentimento de que o morto é usualmente consciente é o da mais maravilhosa e deliciosa liberdade. Ele já não tem absolutamente nada com que se preocupar, e nenhum dever pesa sobre ele, exceto aqueles que ele escolher impor-se. Para todos exceto uma pequeníssima minoria, a vida física é gasta fazendo o que o homem preferiria não fazer; mas tem de fazê-lo a fim de sustentar-se ou à sua esposa e família. No mundo astral nenhum sustento é necessário; já não precisa comer, o agasalho é supérfluo, uma vez que se é inteiramente imune ao calor ou ao frio; e cada homem pelo mero exercício de seu pensamento se veste como quiser. Pela primeira vez desde sua tenra infância o homem é inteiramente livre para passar todo o seu tempo fazendo exatamente apenas o que aprecia.
 
Sua capacidade para todos os tipos de desfrute é grandemente aumentada, bastando que aquele desfrute não careça de um corpo físico para sua expressão. Se ele ama as belezas da Natureza, agora está em seu poder viajar com grande rapidez e sem fadiga por todo o mundo, e contemplar seus lugares mais adoráveis, e explorar seus recessos mais secretos. Se ele se delicia na arte, todas as obras-primas do mundo estão à sua disposição. Se ele ama a música, ele pode ir aonde quiser para ouví-la, e agora ela significará para ele muitíssimo mais do que antes; pois ainda que não possa mais ouvir com os ouvidos físicos, ele pode receber em si o inteiro efeito da música em um grau muito mais pleno do que neste mundo inferior. Se ele é um estudante de ciência, não só pode visitar os grandes cientistas do mundo, e colher deles os pensamentos e idéias que estejam dentro de sua compreensão, mas também pode empreender pesquisas por si mesmo na ciência deste mundo superior, vendo muito mais o que está fazendo do que jamais lhe foi possível antes. E melhor de tudo, aquele cuja grande delícia no mundo foi ajudar seus semelhantes ainda encontrará um amplo escopo para seus esforços filantrópicos.
 
Os homens já não passam fome, frio, ou sofrem de moléstias neste mundo astral; mas há um vasto número dos que, ignorantes, desejam conhecimento – os que, estando ainda atados ao desejo por coisas terrenas, precisam de uma explicação de como voltar seus pensamentos para coisas mais altas – os que se enredaram na teia de suas próprias elucubrações, e só podem ser libertos por quem entende este novo ambiente, e pode lhes ajudar a distinguir os fatos do mundo de sua própria representação ignorante e ilusória deles. Todos esses podem ser ajudados pelo homem inteligente e de bom coração. Muitos homens chegam no mundo astral na total ignorância de suas condições, não percebendo de pronto que estão mortos, e quando realmente o percebem temem o que o destino possa estar lhes reservando, por causa de ensinamento teológico falso e perverso. Todos estes precisam do carinho e conforto que só lhes pode ser dado por um homem de bom senso que possua algum conhecimento dos fatos da natureza.
 
Não há portanto nenhuma falta da mais proveitosa ocupação para qualquer homem cujos interesses durante a vida física tiverem sido racionais; tampouco ele carece lá de companhias. Homens cujos gostos e empenhos são similares naturalmente acabam se reunindo exatamente como o fazem aqui; e muitos reinos da Natureza, que durante nossa vida física estão ocultos pelo denso véu da matéria, agora estão abertos para estudo detalhado dos que se interessam em examiná-los.
 
Em grande medida as pessoas constróem seus próprios ambientes. Nós já mencionamos as sete subdivisões deste mundo astral. Numerando-as da mais elevada e menos material para baixo, vemos que recaem naturalmente em três classes – as divisões um, dois e três formando uma classe, e as quatro, cinco e seis outra, enquanto a sétima e mais baixa de todas permanece sozinha. Como disse, mesmo que se interpenetrem, suas substâncias têm uma tendência geral de se arranjar de acordo com sua gravidade específica, de modo que a maior parte da matéria das subdivisões mais altas é encontrada mais alto sobre a superfície da Terra do que o grosso da matéria das porções inferiores.
 
Daí que, mesmo que qualquer pessoa habitando o mundo astral possa se mover para qualquer parte dele, sua tendência natural é flutuar no nível que corresponde à gravidade específica da matéria mais pesada de seu corpo astral. O homem que não permitiu a redistribuição da matéria de seu corpo astral após a morte está inteiramente livre em todo o mundo astral; mas a maioria, que o permitiu, não é igualmente livre – não porque haja qualquer coisa que os impeça de subir até o mais alto ou mergulhar até o mais baixo nível, mas porque são capazes de sentir com clareza só uma certa parte daquele mundo.
 
Eu descrevi algo sobre o destino de um homem que esteja no nível mais baixo, encerrado em uma forte concha de matéria grosseira. Por causa da comparativamente extrema densidade daquela matéria ele é cônscio de menos entorno de sua subdivisão do que um homem em qualquer outro nível. A gravidade específica geral de seu próprio corpo astral tende a fazê-lo flutuar abaixo da superfície da Terra. A matéria física da Terra é absolutamente inexistente aos seus sentidos astrais, e sua atração natural é para a forma de matéria astral menos delicada que constitui a contraparte da Terra sólida. Um homem que se tenha confinado àquela subdivisão inferior portanto se encontrará usualmente flutuando na escuridão e em grande medida apartado dos outros mortos, cujas vidas foram mantidas em um nível mais elevado.
 
As divisões quatro, cinco e seis do mundo astral (às quais a maioria das pessoas é atraída) têm como pano de fundo a contraparte astral do mundo em que vivemos, e todos os seus acessórios familiares. A vida na sexta subdivisão é simplesmente como nossa vida comum nesta Terra excetuando o corpo físico e suas necessidades; enquanto que ascendendo através das divisões quinta e sexta ela se torna menos e menos material e é cada vez mais alheia ao nosso mundo inferior e seus interesses.
 
As seções primeira, segunda e terceira, ainda que ocupando o mesmo espaço, já dão a impressão de estarem muito mais distantes do físico, e são correspondentemente menos materiais. Os homens que habitam estes níveis perdem de vista a Terra e seus pertences; estão de costume profundamente auto-absorvidos, e em grande medida criam seus próprios ambientes, ainda que estes sejam suficientemente objetivos para serem percebidos pelos outros homens do seu nível, e também à visão clarividente.
 
Esta região é a “Terra de Verão” de que ouvimos falar nos círculos espíritas – o mundo em que, pelo exercício de seu pensamento, os mortos trazem à existência temporária suas casas e escolas e cidades. Estes ambientes, mesmo que fantasiosos sob nosso ponto de vista, são para os mortos tão reais como as casas, templos ou igrejas construídos de pedra o são para nós, e muitas pessoas vivem muito contentes lá por certo número de anos em meio a todas estas criações do pensamento.
 
Alguns dos cenários assim produzidos são muito belos; incluem adoráveis lagos, magníficas montanhas, agradáveis jardins, decididamente superiores a qualquer coisa no mundo físico; ainda que por outro lado contenham muito do que para o clarividente treinado (que aprendeu a ver as coisas como elas são) pareça ridículo – como, por exemplo, as tentativas dos incultos de produzir uma forma-pensamento de algumas das curiosas descrições simbólicas contidas nas suas várias Escrituras. A imagem-pensamento de uma criatura cheia de olhos, feita por um camponês ignorante, ou de um mar de vidro misturado com fogo [imagens simbólicas contidas no Apocalipse de São João - NT], naturalmente muitas vezes são grotescas, mesmo que para seu criador sejam perfeitamente satisfatórias. Este mundo astral é cheio de criações-pensamento de figuras e paisagens. Homens de todas as religiões imaginam aqui suas deidades e suas respectivas concepções do paraíso, e desfrutam grandemente em meio a estas formas oníricas até que passam para o mundo mental e entram em contato com algo mais próximo da realidade.
 
Cada pessoa após a morte – qualquer pessoa comum, isto é, em cujo caso o rearranjo de matéria do corpo astral ocorreu – tem por sua vez que passar através de todas estas subdivisões. Não segue daí que cada uma esteja consciente em todas elas. A pessoa decente comum tem em seu corpo astral somente pouca matéria de sua porção inferior – não o bastante para construir uma concha pesada. A redistribuição coloca na parte externa de seu corpo sua matéria mais densa; no homem comum é usualmente matéria da sexta subdivisão, misturada com um pouco da sétima, e então ele se acha vendo a contraparte do mundo físico.
 
O Ego está constantemente se recolhendo para dentro de si mesmo, e à medida que se retira deixa atrás de si nível após nível desta matéria astral. Assim, a duração da permanência do homem em cada seção do mundo astral está em proporção direta da quantidade de sua matéria que é encontrada em seu corpo astral, e isso por sua vez depende da vida que ele viveu, dos desejos a que cedeu, e da classe de matéria que por conseguinte atraiu e incorporou a si. Encontrando-se então na sexta seção, ainda pairando perto dos locais e pessoas a que ele estava mais proximamente ligado enquanto na Terra, o homem comum no passar do tempo vê os ambientes terrestres gradualmente se desvanecendo e deixando progressivamente de ter importância para ele, e ele tende mais e mais a moldar seu entorno de acordo com os mais persistentes de seus pensamentos. Quando ele alcança o terceiro nível ele descobre que esta característica sobrepujou inteiramente a visão das realidades do mundo astral.
 
A segunda subdivisão é uma sombra menos material que a terceira, pois se esta é a Terra de Verão dos espíritas, aquela é o Céu material dos ortodoxos mais ignorantes; enquanto que o primeiro ou mais elevado nível parece ser a morada especial daqueles que durante a vida se devotaram a interesses materialistas mas intelectuais, seguindo-os não por amor de beneficiar seus semelhantes, mas por motivos de ambição pessoal ou simplesmente por amor do exercício intelectual. Todas estas pessoas são perfeitamente felizes. Mais adiante chegarão em um estágio em que poderão apreciar algo muito mais elevado, e quando este estágio chega o encontrarão o superior pronto para elas.
 
Nesta vida astral as pessoas da mesma nação e com os mesmos interesses tendem a permanecer juntas, precisamente como o fazem aqui. As pessoas religiosas, por exemplo, que imaginam para si um céu material, não interferem em nada com os homens de outras crenças cujas idéias de felicidade celeste são diferentes. Não há nada que impeça um Cristão de penetrar no céu do Hinduísta, ou do Maometano, mas dificilmente o fará, porque seus interesses e atrações estão todos no céu de sua própria fé, junto com amigos que compartilharam aquela crença com ele. De modo algum este é o céu verdadeiro descrito por qualquer uma das religiões, mas apenas uma grosseira e material pseudo-representação dele; a coisa real será encontrada quando viermos a considerar o mundo mental.
 
O morto que não permitiu o rearranjo da matéria de seu corpo astral é livre em todo este mundo, e pode perambular em toda parte à vontade, vendo o todo do que quer que examine, em vez de somente uma parte como os outros fazem. Ele não o acha inconvenientemente superpovoado, pois o mundo astral é muito maior que a superfície da Terra física, enquanto que sua população é algo menor, porque a vida média da humanidade no mundo astral é mais curta que a média no físico.
 
Contudo, nem só os mortos são os habitantes deste mundo astral, mas também cerca de um terço dos viventes, os que temporariamente deixaram para trás seus corpos físicos a dormir. O mundo astral tem ainda um grande número de habitantes não-humanos, alguns deles muito abaixo do nível humano, e alguns consideravelmente acima. Os espíritos da natureza formam um imenso reino, do qual alguns membros existem no mundo astral, e constituem uma grande parte de sua população. Este vasto reino também existe no mundo físico, pois muitas de suas ordens usam corpos etéricos, e estão logo além do alcance da visão física comum. De fato, ocorrem circunstâncias não infreqüentes quando eles podem ser vistos, e em muitos distritos montanhosos distantes estas aparições são tradicionais entre os camponeses, que comumente lhes chamam fadas, povos bondosos, pixies ou brownies.
 
Eles não têm forma definida e podem assumir qualquer uma, mas usualmente preferem utilizar uma forma humana miniatura. Uma vez que não são ainda individualizados, podem ser considerados quase como animais etéricos e astrais; mesmo que muitos deles emparelhem, no intelecto, à humanidade comum. Eles têm suas nações e raças exatamente como nós, e são freqüentemente agrupados em quatro grandes classes, chamadas espíritos da terra, da água, do fogo e do ar. Somente os membros da última destas quatro divisões residem normalmente no mundo astral, mas seu número é tão prodigioso que estão presentes em toda parte nele.
 
Um outro grande reino tem seus representantes aqui – o Reino dos Anjos (chamados na Índia de Devas). Este é um conjunto de seres que estão muito mais alto na evolução que o homem, e somente a orla mais inferior de suas hostes toca o mundo astral – uma orla cujos membros constituintes estão talvez perto do nível de desenvolvimento do que chamaríamos um homem distinguidamente bom.
 
Nós não somos nem os únicos nem mesmo os principais habitantes de nosso sistema solar; há outras linhas de evolução correndo paralelas à nossa que jamais passam pela humanidade, ainda que devam todas passar por um nível correspondente ao da humanidade. Em uma destas outras linhas de evolução estão os espíritos da natureza acima descritos, e em um nível mais alto desta linha vem este grande reino dos Anjos. Em nosso presente nível de evolução eles entram em contato evidente conosco só mui raramente, mas ao nos desenvolvermos deveremos ver mais deles – especialmente agora que o progresso cíclico do mundo está mais e mais colocando-o sob influência do Sétimo Raio. Este Sétimo Raio tem o cerimonial como uma de suas características, e é através do cerimonial como o da Igreja ou da Maçonaria que mais facilmente podemos entrar em contato com o Reino Angélico.
 
Quando todas as emoções inferiores do homem tiverem se esgotado – todas as emoções, quero dizer, que têm em si algum pensamento sobre o eu – sua vida no mundo astral termina, e o Ego passa para o mundo mental. De modo algum este é um movimento no espaço; é simplesmente que o progressivo processo de recolhimento passou além mesmo do mais fino tipo de matéria astral; então a consciência do homem se focaliza no mundo mental. Seu corpo astral ainda não se terá desintegrado completamente, mesmo que esteja em vias de fazê-lo, e ele deixa para trás um cadáver astral, exatamente como no estágio anterior da introspecção ele deixou para trás de si um cadáver físico. Há uma certa diferença entre os dois que deve ser mencionada, por causa das conseqüências que derivam disso.
 
Quando o homem deixa seu corpo físico sua separação dele deveria ser completa, e geralmente é assim; mas este não é o caso da matéria muito mais fina do corpo astral. No curso de sua vida física o homem comum usualmente se envolve tanto em matéria astral (o que, de um outro ponto de vista, significa que ele se identifica mui intimamente com seus desejos inferiores) que a força interiorizante do Ego não pode mais separá-lo dela novamente. Por conseguinte, quando enfim ele se retira do corpo astral e transfere suas atividades para o mental, ele perde um pouco de si mesmo, deixa algo de si para trás aprisionado na matéria do corpo astral.
 
Isto dá um certo resíduo de vitalidade ao cadáver astral, de modo que ele ainda se move livremente no mundo astral, e pode facilmente ser confundido com o próprio homem pelo ignorante – ainda mais que tal consciência fragmentária que ainda permanece nele é parte do homem, e portanto naturalmente se considera e fala de si como sendo o homem. Ele retém sua memórias mas é só uma representação parcial e insatisfatória dele. Algumas vezes nas sessões espíritas se entra em contato com uma entidade deste tipo, e nos admiramos do quanto aquele amigo decaiu desde sua morte. A esta entidade fragmentária damos o nome de “sombra”.
 
Num estágio ulterior também este fragmento de consciência morre no corpo astral, mas não retorna ao Ego a quem pertencia originalmente. Mesmo então o cadáver astral ainda permanece, mas quando já não possui qualquer traço de sua vida anterior o chamamos de “casca”. Por si mesma uma casca não pode se comunicar numa sessão, ou agir de qualquer forma; mas tais cascas são freqüentemente apanhadas por espíritos da natureza brincalhões e usadas como habitações temporárias. Uma casca assim ocupada pode se comunicar em uma sessão, mascarada como se fosse seu proprietário original, uma vez que algumas de suas características e certas partes de sua memória podem ser evocadas pelo espírito da natureza a partir deste cadáver astral.
 
Quando um homem adormece, ele se recolhe em seu corpo astral, deixando todo o veículo físico para trás. Quando morre, leva consigo a parte etérica do corpo físico, e com isso normalmente tem pelo menos um momento de inconsciência enquanto se livra dela. O duplo etérico não é um veículo, e não pode ser usado como tal; assim enquanto um homem estiver cercado por ele, por um momento não será capaz de atuar nem no mundo físico nem no astral. Alguns homens conseguem livrar-se de seu envelope etérico em poucos minutos; outros ficam lá horas, dias ou mesmo semanas.
 
Tampouco é certo de que quando o homem se livra dele, imediatamente se torna consciente do mundo astral. Pois há nele uma boa quantidade do tipo inferior de matéria astral, e assim uma concha feita dela pode se formar ao seu redor. Mas ele pode ser de todo incapaz de usar esta matéria. Se ele tiver vivido uma vida razoavelmente decente ele estará pouco habituado a empregá-la ou responder às suas vibrações, e não pode instantaneamente adquirir este hábito. Por esta razão, ele pode permanecer inconsciente até que gradualmente esta matéria se desprenda, e alguma matéria que ele tem o hábito de utilizar aflore à superfície. Esta oclusão, contudo, dificilmente é completa, pois mesmo na concha mais cuidadosamente construída algumas partículas da matéria mais fina ocasionalmente acham caminho para a superfície e lhe dão vislumbres fugazes das redondezas.
 
Há alguns homens que se agarram tão desesperadamente a seus veículos físicos que não afrouxam sua posse sobre o duplo etérico, mas se empenham com todas as forças em retê-lo. Eles podem ter sucesso nisso durante um bom tempo, mas só a custo de grande desconforto para eles mesmos. Eles estão excluídos de ambos os mundos, e se encontram rodeados de uma densa névoa cinza, através da qual eles vêem muito fracamente as coisas do mundo físico, mas com todas as cores perdidas. Para eles é uma luta terrível manter sua posição nesta condição miserável, mas não abrem mão do duplo etérico, sentindo que ele é pelo menos algum tipo de elo com o único mundo que conhecem. Então eles vagam em uma condição de solidão e miséria até que, extremamente fatigados, afrouxam a tensão, e deslizam para a comparativa felicidade do mundo astral. Às vezes em seu desespero procuram cegamente por outros corpos, e tentam entrar neles, e ocasionalmente são bem sucedidos nesta tentativa. Eles podem se apoderar de um corpo de bebê, expulsando a frágil personalidade para a qual era destinado, ou algumas vezes se valem mesmo do corpo de um animal. Toda esta tribulação deriva inteiramente da ignorância, e jamais pode acontecer para qualquer um que entenda as leis da vida e da morte.
 
Quando a vida astral encerra, o homem por sua vez morre para aquele mundo, e desperta no mundo mental. Com ele não sucede o que sucede ao clarividente treinado, que se move através dele e vive por entre o ambiente que encontra lá, precisamente como faria nos mundos físico ou astral. O homem comum por toda sua vida foi-se cercando de uma massa de formas-pensamento. Algumas que são transitórias, a que ele prestou pouca atenção, se desvaneceram há muito tempo, mas aquelas que representam os principais interesses de sua vida estão sempre com ele, e ficam cada vez mais fortes. Se algumas destas forem egoístas, sua força se derrama na matéria astral, e ele as esgota durante sua vida no mundo astral. Mas aquelas que são inteiramente altruístas pertencem puramente a seu corpo mental, e assim quando ele se encontra no mundo mental será através destes pensamentos especiais que ele será capaz de apreciá-lo.
 
Seu corpo mental de modo algum estará completamente desenvolvido; as partes dele que estarão realmente ativas em plena medida são só as que usou de modo altruístico. Quando ele desperta novamente após a segunda morte sua primeira sensação é de uma indescritível beatitude e vitalidade – um sentimento de tão completo júbilo de viver que por um tempo ele não precisa de nada além de apenas viver. Tal beatitude é da essência da vida em todos os mundos superiores do sistema. Mesmo a vida astral tem possibilidades de felicidade de longe maiores do que qualquer coisa que pudéssemos conhecer no corpo denso; mas a vida celeste no mundo mental é além de todas as proporções mais bem-aventurada que a astral. Em cada mundo mais elevado a mesma experiência é repetida. Meramente viver em algum deles parece ser a mais excelsa beatitude concebível; mas já quando a próxima é atingida, parece que ultrapassa em muito a anterior.
 
Assim como a bem-aventurança aumenta, igualmente aumentam a sabedoria e amplitude de visão. O homem se agita pelo mundo e se imagina tão ocupado e tão sábio; mas quando toca mesmo o astral, ele percebe incontinenti que tem sido todo o tempo só uma larva rastejante que não vê nada além da sua própria folha, enquanto agora ele abre suas asas como a borboleta e voa para a luz do sol de um mundo mais vasto. Pois, impossível que possa parecer, a mesma experiência se repete quando passa para o mundo mental, pois esta vida é por sua vez tão mais plena e ampla e mais intensa que a astral que novamente nenhuma comparação é possível. E ainda além de todas estas existe ainda uma outra vida, a do mundo intuicional, para a qual mesmo esta é só como o luar comparado com a luz do sol.
 
Agora a situação do homem no mundo mental difere largamente daquela no astral. Lá ele estava usando um corpo ao qual estava inteiramente acostumado, um corpo que ele tinha o hábito de empregar a cada noite durante o sono. Aqui ele se encontra vivendo em um veículo que ele nunca usou antes – um veículo, além do mais, que está muito longe de estar plenamente desenvolvido – um veículo que o exclui ainda mais do mundo ao seu redor, em vez de possibilitar-lhe que o veja. A parte inferior de sua natureza gastou-se durante sua vida purgatorial, e agora só lhe restam seus mais elevados e refinados pensamentos, as nobres e altruísticas aspirações que ele cultivou durante sua vida terrestre. Esta aglomeração o rodeia, e forma uma espécie de concha em seu redor, por meio da qual ele é capaz de responder a certos tipos de vibrações nesta matéria refinada.
 
Estes pensamentos que o circundam são os poderes pelos quais ele usufrui da pletora do mundo celeste, e a descobre sendo um repositório de extensão infinita, o qual ele é capaz de utilizar exatamente de acordo com o poder daqueles pensamentos e aspirações; pois neste mundo existe a infinita plenitude da Mente Divina, aberta em toda sua ilimitada riqueza a cada alma, precisamente na proporção em que aquela alma qualificou-se para receber. Um homem que já completou sua evolução humana, que já realizou e desdobrou a divindade cujo germe está nele, encontra toda esta glória ao seu alcance; mas desde que nenhum de nós ainda o fez, uma vez que só gradualmente estamos ascendendo em direção daquela consumação esplêndida, ocorre que nenhum de nós ainda a pode captar inteiramente.
 
Mas cada um retira dela e a percebe tanto quanto seus esforços prévios o prepararam para fazê-lo. Indivíduos diferentes trazem capacidades diferentes; dizem-nos no Oriente que cada homem tem sua própria taça, e algumas taças são grandes e algumas são pequenas, mas pequenas ou grandes, cada taça é preenchida até o máximo de sua capacidade; o mar de bem-aventurança guarda mais que o suficiente para todos.
 
Um homem pode contemplar esta glória e beleza somente através da janelas que ele próprio tiver feito. Cada uma destas formas-pensamento é como uma janela, através da qual uma resposta pode lhe chegar das forças exteriores. Se durante sua vida terrestre ele considerou principalmente coisas físicas, então ele terá feito para si só poucas janelas pelas quais esta glória superior pode brilhar sobre ele. Pois todo homem que está acima do mais baixo selvagem deve ter tido algum toque de puro sentimento altruísta, mesmo tendo sido uma única vez em toda sua vida, e aquilo agora será uma janela para ele.
 
O homem comum não é capaz de qualquer grande atividade neste mundo mental; sua condição é principalmente receptiva, e sua visão de qualquer coisa fora de sua própria concha de pensamentos é do mais limitado caráter. Ele está rodeado de forças vivas, poderosos habitantes angélicos deste mundo glorioso, e muitas de suas ordens são muito sensíveis a certas aspirações do homem e prontamente respondem a elas. Mas um homem pode tirar vantagem disso só até onde ele já tiver se preparado para aproveitá-lo, pois seus pensamentos e aspirações estão somente ao longo de certas linhas, e ele não pode criar subitamente linhas novas. Há muitas direções em que o pensamento superior pode atuar – algumas delas pessoais e outras impessoais. Entre estas últimas estão a arte, a música e a filosofia; e um homem cujo interesse resida ao longo de qualquer destas linhas encontra desfrute imensurável e instrução ilimitada esperando por ele – isto é, a quantidade de desfrute e instrução é limitada apenas pelo seu poder de percepção.
 
Encontramos um grande número de pessoas cujos únicos pensamentos superiores foram aqueles relacionados com afeto e devoção. Se um homem ama outro profundamente ou se sente forte devoção por uma deidade pessoal, ele faz uma forte imagem mental daquele amigo ou deidade, e o objeto de seu sentimento está freqüentemente presente em sua mente. Inevitavelmente ele leva esta imagem mental para o céu consigo, porque é àquele nível de matéria que ela naturalmente pertence.
 
Tomemos primeiro o sentimento de afeição. O amor que forma e mantém uma tal imagem é uma força muito poderosa – uma força que é forte bastante para alcançar e agir sobre o Ego de seu amigo na parte superior do mundo mental. É aquele Ego que é o homem real a quem ama – não o corpo físico que é só uma representação tão parcial dele. O Ego do amigo, sentindo esta vibração, de imediato e avidamente responde-lhe, e se derrama na forma-pensamento que foi feita para ele; assim pois o amigo do homem está em verdade consigo mais vividamente presente do que jamais esteve antes. Para este resultado não faz diferença que o amigo esteja vivo ou morto; o apelo é feito não ao fragmento do amigo que está às vezes aprisionado num corpo físico, mas ao próprio homem em seu próprio e verdadeiro nível; e ele sempre responde. Um homem que tem uma centena de amigos pode simultânea e plenamente responder à afeição de cada um deles, pois nenhum número de representações em um nível inferior pode exaurir a infinitude do Ego.
 
Assim todo homem em sua vida celeste tem ao seu redor todos os amigos cuja companhia deseje, e estão para ele sempre em sua melhor condição, porque ele próprio faz por eles a forma-pensamento pela qual se lhe manifestam. Em nosso limitado mundo físico estamos tão acostumados a pensar em nossos amigos só como a manifestação limitada que conhecemos no mundo físico, que a princípio nos é difícil perceber a grandiosidade do esquema; quando a percebemos, vemos quão mais próximos estamos da verdade em relação aos nossos amigos na vida celeste do que jamais estivemos aqui na Terra. O mesmo é verdade no caso da devoção. O homem no mundo celeste está dois grandes estágios mais perto do objeto de sua devoção do que estava em sua vida física, e assim suas experiências são de um caráter muito mais transcendente.
 
Neste mundo mental, assim como no astral, há sete subdivisões. A primeira, segunda e terceira são a morada do Ego em seu corpo causal, pois o corpo mental contém matéria apenas das outros quatro, e é naquelas seções que sua vida celeste transcorre. O homem não passa, contudo, de uma para outra delas, como no caso do mundo astral, pois não há nada nesta vida que corresponda ao rearranjo (de matéria do corpo). Antes o homem é levado ao nível que melhor corresponde ao grau de seu desenvolvimento, e naquele nível passa toda a sua vida no corpo mental. Cada homem cria suas próprias condições, assim o número de variedades é infinito.
 
Falando em linhas gerais, podemos dizer que a característica dominante observada na seção inferior é a afeição familiar altruísta. Deve ser altruísta, ou não encontrará lugar aqui; todas as cores egoístas, se houver alguma, colheram seus resultados no mundo astral. Podemos dizer que a característica dominante do sexto nível é a devoção religiosa antropomórfica; enquanto que a da quinta seção é a devoção expressa através de algum tipo de trabalho ativo. Todas estas – a quinta, sexta e sétima subdivisões – estão ligadas à frutificação da devoção a personalidades (seja à família e amigos ou a uma deidade pessoal) antes que a devoção mais ampla à humanidade por amor a ela, que acha sua expressão na próxima seção. As atividades deste quarto estágio são variadas. Elas podem ser melhor arranjadas em quatro divisões principais: busca altruísta de conhecimento espiritual; alto pensamento filosófico ou científico; habilidade literária ou artística exercida com propósitos altruístas; e serviço por amor ao serviço.
 
Mesmo para esta vida celeste gloriosa um fim chega, e então o corpo mental por sua vez se desprende como os outros o fizeram, e a vida do homem em seu corpo causal inicia. Aqui o homem não precisa de janelas, pois esta é sua morada real e todas as paredes caíram. A maioria dos homens ainda só possui reduzidíssima consciência em um nível tão alto como este; eles repousam sonhadoramente absortos e escassamente despertos, mas qualquer visão que tenham é verdadeira, por mais limitada que possa ser por sua falta de desenvolvimento. Ainda, a cada vez que retornarem estas limitações serão menores, e eles próprios serão cada vez maiores; de modo que esta vida mais real ser-lhes-á mais plena e ampla.
 
Continuando o progresso, esta vida causal torna-se mais prolongada, assumindo uma proporção sempre maior comparada à existência em níveis inferiores. E à medida que cresce, o homem se torna capaz não só de receber, mas também de dar. Então de fato seu triunfo se aproxima, pois ele estará aprendendo a lição do Cristo, aprendendo a glória magna do sacrifício, o supremo deleite de derramar toda sua vida em auxílio de seus semelhantes, a devoção do eu ao todo, a força celestial do serviço humano, e todas aquelas esplêndidas forças celestes para a ajuda aos lutadores filhos da Terra. Isto é parte da vida que nos aguarda; estes são alguns do degraus que mesmo nós que estamos tão perto da base da escada dourada podemos ver se elevando acima de nós, de modo que podemos falar deles para os que ainda não viram, a fim de que eles também possam abrir seus olhos para o esplendor inimaginável que os rodeia aqui e agora em seu pobre cotidiano. Esta é uma parte do evangelho da Teosofia – a certeza deste futuro sublime para todos. É certo porque já está aqui; porque para herdá-lo só temos que nos preparar para ele.
 

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