A Mediunidade Ensinada na Filosofia Antiga

Enviado por Estante Virtual em qui, 22/12/2011 - 03:06

Eram "médiuns" esses homens semelhantes a Deus, como pretendem os espiritistas ortodoxos? De modo algum, se pelo termo compreendemos os "sensitivos doentes", que nasceram com uma organização peculiar, e que em proporção aos seus podres se desenvolveram mais os menos sujeitos à influência irresistível de espíritos diversos, puramente humanos, elementares ou elementais. Isso é incontestável, se considerarmos todo indivíduo como um médium em cuja atmosfera magnética os habitantes das esferas invisíveis superiores podem mover-se, e agir, e viver. Neste sentido, toda pessoa é um médium. A mediunidade pode ser 1º) autodesenvolvida; 2º) motivada por influências estranhas; ou 3º) pode permanecer em estado latente por toda a vida. O leitor deve ter em mente a definição do termo, pois, a não ser que isso claramente compreendido, a confusão será inevitável. A mediunidade dessa espécie pode ser ativa ou passiva, repelente ou receptiva, positiva ou negativa. A mediunidade é medida pela quantidade da aura pela qual o indivíduo é envolvido. Ela pode ser densa, nebulosa, nociva, mefítica, nauseabunda para o espírito puro e atrair apenas aqueles seres abomináveis que se comprazem com ela, como a enguia o faz nas águas turvas, ou pode ser pura, cristalina, límpida, opalescente como a aurora. Tudo depende do caráter moral do médium.

Em torno de homens como Apolônio, Jâmblico, Plotino e Porfírio condensava-se este nimbo celeste. Ele era engendrado pelo poder de suas próprias almas em estreita harmonia com seus espíritos; pela moralidade e santidade sobre-humanas de suas vidas, e ajudados pela contínua contemplação estática interior. As puras influências espirituais podiam aproximar-se de tais homens. Radiando à sua volta uma atmosfera de beneficência divina, eles punham em fuga os maus espíritos. Não apenas não é possível a estes existirem em sua aura, mas eles não podem permanecer mesmo na de pessoas obcecadas, se o taumaturgo exerce a sua vontade, ou mesmo se aproxima delas. Isto é MEDIAÇÃO, não mediunidade. Tais pessoas são templos nos quais habita e espírito do Deus vivo; mas se o tempo está maculado pela admissão de paixões, pensamentos ou desejos, o mediador cai na esfera da feitiçaria. A porta está aberta; os espíritos puros se retiram e os maus entram de tropel. Isto ainda é mediação, ainda que má; o feiticeiro, assim como o mágico puro, forma a sua própria aura e submete à sua vontade os espíritos inferiores que lhe são afins.

Mas a mediunidade, como hoje se compreende e se manifesta, é uma coisa diferente. As circunstâncias, independentemente de suas própria vontade, podem, por ocasião do nascimento ou depois, modificar a aura de uma pessoa, de modo que manifestações estranhas, físicas e mentais, diabólicas ou angélicas, podem ocorrer. Tal mediunidade, assim como a mediação acima mencionado, existe na Terra desde que o homem nela fez a sua primeira aparição. A primeira é a submissão da carne fraca e mortal pelo controle e pelas sugestões de outros espíritos e inteligências que não o nosso próprio demônio imortal. É literalmente a obsessão e a possessão; e médiuns que se orgulham de ser escravos fieis de seus "guias", e que repudiam com indignação a idéia de "controlar" as manifestações, "não podem contestar o fato de maneira consistente. Essa mediunidade é simbolizada na história de Eva sucumbindo às artimanhas da serpente; de Pandora espremendo a caixa proibida e deixando escapar ao mundo a tristeza e o mal, e por Maria Madalena, que depois de ter sido obsedada por `sete demônios', foi finalmente redimida pela luta vitoriosa de seu espírito imortal, tocado pela presença de um santo mediador, contra o obsessor". Essa mediunidade, benéfica ou maléfica, é sempre passiva. Felizes são os puros de espírito, que repelem inconscientemente, graças à pureza de sua natureza interior, os sombrios espíritos do mal. Pois na verdade eles não têm outras armas de defesa a não ser a bondade e a pureza inata. A mediunidade, tal como é praticada em nossos dias, é um dom bem menos admirável do que o manto de Nesso.

"Conhece-se a árvores por seus frutos." Lado a lado com os médiuns passivos no progresso da história do mundo, aparecem os mediadores ativos. Nós os designamos por esse nome à falta de um melhor. Os antigos feiticeiros e mágicos, e os que tinham um "espírito familiar", comerciavam com os seus dons; e a mulher de Obeah de En-Dor, tão bem retratado por Henbry More, embora ela possa ter sacrificado um filhote para Saul, aceitava dinheiro de outros visitantes. Na Índia, os prestidigitadores, que, diga-se de passagem, o são menos do que muitos médiuns modernos, e os Essaoua, ou feiticeiros e encantadores de serpentes da Ásia e da África, todos exercem seus dons por causa do dinheiro. Não se dá o mesmo com os mediadores ou hierofantes. Buddha recusou o trono do pai para ser um mendicante. O "Filho do Homem não tinha onde repousar a cabeça"; os apóstolos eleitos não tinham "nem ouro, nem prata, nem bronze em sua bolsas".

Apolônio deu metade de sua fortuna a seus familiares, e a outra metade aos pobres; Jâmblico e Plotino eram célebres por sua caridade e abnegação; os faquires, ou santos mendicantes da Índia, são fielmente descritos por Jacolliot; os essênios pitagóricos e os terapeutas acreditavam que suas mãos definhariam ao contato com o dinheiro. Quando ofereciam dinheiro aos apóstolos para que comunicassem seus poderes espirituais, Pedro, embora a Bíblia o mostre como um covarde e por três vezes como um renegado, repelia indignado a oferta, dizendo: "Que teu dinheiro pereça contigo, pois pensas que o dom do Senhor pode ser comprado com dinheiro". Esses homens eram mediadores, guiados apenas por seu próprio espírito pessoal, ou alma divina, e servindo-se da ajuda de espíritos apenas até onde estes se conservassem no bom caminho.

Longe de nós o pensamento de lançar uma mácula injusta sobre os médiuns físicos. Exauridos por diversas inteligências, reduzidos pela influência predominante dos espíritos - à qual suas naturezas fracas e nervosas são incapazes de resistir - a um estado mórbido, que ao fim se torna crônico, eles são impedidos por essas "influências" de assumir outra ocupação. Eles se tornam mental e fisicamente incapazes para qualquer outra atividade. Quem pode julgá-los severamente quando, lançados numa situação extrema, são constrangidos a aceitar a mediunidade como um negócio? E o céu sabe, como bem o demonstraram os últimos acontecimentos, se essa profissão deve ser invejada por quem quer que seja! Não são os médiuns, os médiuns leais, verdadeiros e honestos que jamais censuraríamos, mas seus patrões, os espiritistas.

Diz-se que Plotino, quando lhe pediram que assistisse à adoração pública dos deuses, respondeu altivamente: "Cabe a eles (os espíritos) virem a mim". Jâmblico afirmava e provava, por seu próprio caso, que nossa alma pode atingir a comunhão com as inteligências superiores, de "natureza mais elevada que a nossa própria", e expulsava cuidadosamente de suas cerimônias teúrgicas todos os espíritos inferiores, ou maus demônios, que ele ensinava os discípulos a reconhecer. Proclo, que "elaborou toda a teosofia e a teurgia de seus predecessores num sistema completo", de acordo com o Prof. Wilder, "acreditava com Jâmblico na possibilidade de obter um poder divino, que, ultrapassando a vida mundana, tornava o indivíduo um órgão da Divindade". Ele ensinava ainda que havia uma "senha mística que conduziria uma pessoa de uma ordem de seres espirituais a outra, mais e mais alto, até que ela chegasse ao divino absoluto". Apolônio desprezava os feiticeiros e os "adivinhos vulgares", e afirmava que era o seu "modo de vida sóbrio peculiar" que "produziu a acuidade dos sentidos e criou outras faculdades, de modo que coisas maiores e mais notáveis podiam ter lugar". Jesus proclamava ser o homem o senhor do Sabbath, e ao seu comando os espíritos terrestres e elementares fugiam de suas moradas temporárias; um poder que foi partilhado por Apolônio e por muitos da Irmandade dos Essênios da Judéia e do Monte Carmelo.

É inegável que deve ter havido boas razões para que os antigos perseguissem os médiuns desregrados. De outro modo, por que, ao tempo de Moisés e Davi e Samuel, teriam eles encontrado a profecia e a premonição, a Astrologia e a adivinhação, e mantido escolas e colégios nos quais esses dons naturais eram fortificados e desenvolvidos, ao passo que os feiticeiros e os que adivinhavam pelo espírito de Ob (Ob - Hebreu - A Luz astral, melhor dizendo, suas correntes daninhas, personificadas para os judeus como um Espírito, o Espírito de Ob.) foram condenados à morte? Mesmo ao tempo de Cristo, os pobres médiuns oprimidos foram lançados nos túmulos e lugares desertos fora dos muros da cidade. Por que essas injurias aparentemente grosseira? Por que o banimento, a perseguição e a morte terem sido a paga dos médiuns físicos daqueles dias, e todas as comunidades de taumaturgos - como os essênios - serem não apenas toleradas, mas reverenciadas É porque os antigos, ao contrário de nós, podiam "provar" os espíritos e discernir a diferença entre espíritos bons e maus, os humanos e os elementais. Eles também sabiam que o relacionamento com espíritos desregrados trazia ruína para o indivíduo e desastre para a comunidade.

Essa maneira de ver a mediunidade pode ser insólita e talvez repugnante a muitos espiritistas modernos; mas é a visão ensinada na filosofia antiga, e demonstrada pela experiência da Humanidade desde tempos imemoriais.

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