Batismo, um direito derivado

Enviado por Estante Virtual em sex, 23/11/2012 - 00:45
O batismo é um dos ritos mais antigos e foi praticado por todas as nações em seus mistérios, como abluções sagradas (Banho de todo o corpo ou parte dele.) Dunlap parece derivar o nome dos nazars de nazah, "aspersão"; Bahâk-Ziwa é o gênio que chamou o mundo à existência tirando-o da "água obscura", dizem os nazarenos; e o Persian, Arabic asd English Lexicon de Ricahardson afirma que a palavra Bahãk significa "chuva". Mas o Bahâk-Ziwa dos nazarenos não pode ser confundido tão facilmente com Baco, que "era e deus da chuva", pois os nazars foram os maiores adversários do culto de Baco. "Baco foi criado pelas Hyades, as ninfas da chuva", diz Preller; e Dunlap mostra, ademais, que, ao término dos mistérios religiosos, os sacerdotes batizavam (lavavam) seus monumentos e os untavam com óleo. Mas tudo isso é apenas uma prova indireta. Não é preciso provar que o batismo do Jordão era apenas um substituto dos ritos exotéricos de Baco e das libações em honra de Adónis ou Adónis - de quem os nazarenos tinham horror -, no propósito de demonstrar que essa seita nasceu dos "mistérios" da "Doutrina Secreta"; e seus ritos não podem em absoluto ser confundidos com os do populacho pagão, que simplesmente caiu na fé idólatra e irracional de todas as multidões plebéias. João foi o profeta desses nazarenos, e na Galiléia ele foi chamado de "Salvador"; mas não foi ele quem fundou essa seita cujas tradições remontam à mais alta antigüidade da teurgia caldaico-acadiana.
 
"Os primeiros israelitas plebeus eram cananitas e fenícios, com o mesmo culto de adoração aos deuses fálicos - Baco, Baal ou Adon, Iacchos - Iao ou Jeová;" mas mesmo entre esses sempre houve uma classe de adeptos iniciados. Depois, o caráter dessa plebe foi modificado pelas conquistas assírias; e, finalmente, as colonizações persas superpuseram as idéias e os costumes fariseus e orientais, de que derivam o Velho Testamento e as instituições mosaicas. Os reis-sacerdotes asmoneus promulgaram o cânone do Velho Testamento em oposição aos Livros Secretos ou Apocrypha dos judeus alexandrinos - os cabalistas. Até a época de João Hircano eles foram asideus (chasidim) e fariseus (pârsîs), mas tornaram-se saduceus ou zadoquitas - partidários da regra sacerdotal em oposição à regra rabínica. Os fariseus eram dóceis e intelectuais; os saduceus, intolerantes e cruéis.
 
Diz o Codex: "João, filho de Aba-Saba-Zacharia, conhecido por sua mãe Anasabet em seu centésimo ano, batizou durante quarenta e dois anos, quando Iesu Messias veio ao Jordão a fim de ser batizado por João. Mas ele perverterá a doutrina de João, alterando o batismo do Jordão, e pervertendo as sentenças da justiça."
 
O batismo de água transformou-se no do Espírito Santo, em conseqüência, decerto, da idéia predominante entre os padres de instituir uma reforma e tornar os cristãos diferentes dos nazarenos de São João, dos nabateanos e dos ebionistas, a fim de dar lugar aos novos dogmas. Não apenas os sinóticos nos dizem que Jesus batizava como João, mas os próprios discípulos de João se queixavam disso, embora Jesus não possa ser certamente acusado de seguir um rito puramente báquico. Os parênteses no verso 2 de João IV: "(...) ainda que o próprio Jesus não batizasse", são tão canhestros que indicam uma evidente interpolação. Mateus faz João dizer que aquele que viria depois não os batizaria com água, "mas com o Espírito Santo e com fogo". Marcos, Lucas e João corroboram essas palavras. Água, fogo e espírito, ou Espírito Santo, todos têm sua origem na Índia, como iremos demonstrar.
 
Mas tal sentença apresenta uma estranha peculiaridade. Ela é abertamente negada em Atos, XIX, 2-5. Apollos, um judeu de Alexandria, pertencia à seita dos discípulos de São João; foi batizado e instruía a outros nas doutrinas do Batista. E não obstante, quando Paulo, aproveitando habilmente sua ausência em Corinto, encontra alguns discípulos de Apollos em Éfeso, e lhes pergunta se haviam recebido o Espírito Santo, recebe ele essa ingênua resposta: "Nunca ouvimos dizer que há um Espírito Santo". "Em que fostes batizados?", pergunta ele. "No batismo de João", dizem eles. Faz-se então Paulo repetir as palavras atribuídas a João pelos sinóticos, e esses homens "foram batizados em nome de Jesus", exibindo, além disso, no mesmo instante, o usual dom poliglota que acompanha a descida do Espírito Santo.
 
Qual a conclusão a tirar? São João Batista, que é chamado de "percussor", para que "a profecia pudesse ser cumprida", o grande profeta e mártir, cujas palavras tinham um significado tão importante aos olhos de seus discípulos, anuncia o "Espírito Santo" aos seus ouvintes; faz as multidões se reunirem à margens do Jordão, onde, na grande cerimônia do batismo de Cristo, o prometido "Espírito Santo" aparece por entre os céus abertos, e a multidão ouve a voz, e no entanto ainda há discípulos de São João que "nunca ouviram dizer que há um Espírito Santo"!
 
Na verdade, os discípulos que escreveram o Codex nazaraeus estavam certos. Mas não foi Jesus, e sim aqueles que vieram depois dele e tergiversaram a Bíblia para servir aos seus objetivos, que "perverteram" a doutrina de João, modificaram o batismo do Jordão e perverteram as sentenças da justiça".
É inútil objetar que o Codex atual foi escrito séculos depois de os apóstolos diretos de João Batista terem feito seu trabalho de pregação. Tal é o caso dos nossos Evangelhos. Quando esse espantoso diálogo entre Paulo e os "batistas" teve lugar, Bardesanes ainda não havia feito a sua aparição e a seita não era considerada uma "heresia". Além disso, podemos julgar quão pouco a promessa de São João Batista referente ao "Espírito Santo" e a própria manifestação do "Espírito" afetaram seus discípulos, pela animosidade que estes mostraram para com os discípulos de Jesus, e por certa espécie de rivalidade manifestada desde o princípio. Ou melhor, tão pouco está João Batista seguro da identidade de Jesus como o esperado Messias que, depois da famosa cena do batismo no Jordão, e da confirmação oral do próprio Espírito Santo de que "Este é o meu Filho amado" (Matheus, III,17), descobrimos "o Precursor", em Mateus, XI, 3, enviando de sua prisão dois discípulos para perguntar a Jesus: "És tu aquele que há de vir, ou deveremos esperar outro?"!
 
Essa flagrante contradição deveria, por si só, já ter satisfeito às mentes esclarecidas quanto à putativa inspiração divina do Novo Testamento. Mas podemos perguntar ainda: Se o batismo é um sinal de regeneração, e uma prática instituída por Jesus, por que os cristãos não batizam tal como Jesus aqui o faz, "com o Espírito Santo e com fogo", em vez de seguir o costume dos nazarenos? Ao fazer essas evidentes interpolações, que possível motivo teria tido Irineu para fazer as pessoas acreditarem que o epíteto de nazareno, dado a Jesus, provinha apenas da residência de seu pai em Nazaré, e não de sua filiação à seita dos nazaria, os curadores?
 
Esse expediente de Irineu foi muito infeliz, pois desde tempos imemoriais os profetas dos tempos antigos haviam trovejado contra o batismo de fogo, tal como praticado por seus vizinhos, que comunicava o "espírito da profecia", ou o Espírito Santo. Mas o caso era de desespero; os cristãos eram universalmente chamados de nazarenos e iessênios (segundo Epifênio), e Cristo se alinhava simplesmente como um profeta e curador judeu - pois era assim que seus discípulos a si mesmo chamavam, e como tal eram vistos por seus seguidores. Em tal situação, não havia lugar, seja para uma nova Divindade; e como Irineu se entregou à tarefa de manufaturar a ambas, teve de dispor dos materiais disponíveis, preenchendo as lacunas com as suas próprias férteis invenções.

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