Palavras definidas para coisas determinadas

Enviado por Estante Virtual em dom, 02/12/2012 - 20:32

P: Não acha que a confusão que reina em nossa mente sobre as respectivas funções dos "princípios", é exatamente por que não existem termos fixos e definidos para indicar cada "princípio"?

T: Esse é também meu pensamento. A confusão nasceu porque expusemos e discutimos esses "princípios" empregando seus nomes sânscritos, ao invés de inventar imediatamente seus equivalentes em inglês, para uso dos teósofos. Tentaremos remediar nossa falta.

 

P: .É bom, para que se evite maior confusão daqui para a frente. Parece que não se encontram dois escritores teosóficos que estejam de acordo em chamar um mesmo "princípio" pelo mesmo nome.

T: Sem dúvida a confusão é mais aparente do que real. Já ouvi alguns teósofos expressarem surpresa ao falar desses "princípios" e criticarem vários escritos que tratam deles; mas quando se examina detidamente, percebe-se que o único erro que se encontra é ao empregar a palavra "alma" para compreender três princípios, sem especificar as diferenças. O primeiro, e sem dúvida o mais claro de nossos escritores teosóficos, o sr. A. P. Sinnett, escreveu admiravelmente algumas passagens sobre o "Eu Supremo[1]", e também seu verdadeiro pensamento foi mal interpretado por alguns, por empregar a palavra "alma" em sentido geral. Vou transcrever aqui alguns trechos que demonstram quão claro e compreensível é tudo quanto escreveu sobre o assunto:

"A alma humana, uma vez lançada nas correntes da evolução como individualidade humana[2], atravessa períodos alternados de existência física e de existência relativamente espiritual. Passa de um plano ou condição da natureza a outro, sob a direção de suas afinidades kármicas. Vivendo em suas encarnações a vida que seu Karma de antemão lhe preparou; modificando seu progresso dentro dos limites das circunstâncias, e desenvolvendo novo Karma através do uso ou abuso de suas oportunidades, volta à existência espiritual (Devakhan), depois de cada vida física, passando pela região intermediária de Kama-Loka, para o descanso e obsorção gradual em sua essência, como progresso cósmico da experiência da vida adquirida "sobre a terra" ou durante a existência física. Este ponto de vista, aliás, sugeriu muitas inferências colaterais a quem quer que haja pensado neste assunto; como por exemplo, que a transferência deste progresso da consciência, de Kama-Loka ao período devakhânico, terá de ser necessariamente gradual[3]; que na realidade, nenhuma linha de demarcação separa a variedade das condições espirituais; que até os planos espirituais físicos não estão tão absolutamente separados um do outro como pretendem as teorias materialistas, como o demonstram as faculdades psíquicas dos seres vivos; que todos os estados da natureza nos rodeiam simultaneamente e apelam a faculdades perceptivas distintas, e assim sucessivamente'... Claro está que durante a existência física, as pessoas que possuem faculdades psíquicas continuam em relação com os planos da consciência superfísica, e embora muitas possam carecer de tais faculdades, todos somos capazes de entrar em certas condições de consciência que nada têm a ver com os cinco sentidos físicos, como o demonstram os fenômenos do sonho e especialmente os do sonambulismo ou mesmerismo. Nós, as almas que estão em nós, não flutuamos ao acaso sobre o oceano da matéria. Conservamos um interesse, ou direitos bem marcados, a custo do qual nos temos afastado por algum tempo; o processo da encarnação, portanto, não se descreve com toda exatidão quando falamos de uma existência alternada sobre os planos físicos e espirituais, e representamos deste modo a alma como uma entidade completa que passa toda ela de um estado de existência a outro. As definições mais corretas do procedimentos, provavelmente representariam a encarnação como tendo lugar neste plano físico da natureza, por efeito de um eflúvio que emana da alma. A verdadeira morada da alma seria sempre o reino espiritual, o qual não abandonaria nunca por completo; e aquela parte não materializável da alma, que vive permanentemente no plano espiritual, talvez possa chamar-se corretamente o Eu Supremo".

Este "Eu Supremo" é Atmã, e, como diz Sinnett, "não é materializável". Direi ainda mais: jamais pode ser, em circunstância alguma, "objetivo", nem sequer para a percepção espiritual mais elevada. Porque Atmã, o "Eu Supremo", em realidade é Brahma, o Absoluto, e indistinguível deste.

Nos momentos de Samadhi, a mais elevada consciência espiritual do iniciado absorve-se por completo na essência Única, que é Atmã, e, como conseqüência, formando um só com o todo, para ela nada pode haver de objetivo. Alguns teósofos acostumaram-se a empregar as palavras "Self", "Eu" e "Ego", como sinônimas, e de associar o termo "Self" com o mais elevado Ego individual, ou com o eu pessoal do homem, quando na verdade nunca deveria ser aplicado esse termo, exceto referindo-se ao Self (Eu) Único e Universal. Daí a confusão. Falando de manas (o "Corpo Causal"), quando o relacionamos com o resplendor búddhico, podemos chamá-lo de "Ego Superior", mas jamais o "Self ou Eu Supremo". Porque mesmo Buddhi, a "alma espiritual", não é o self, mas tão-somente o veículo do self. Todos os demais Selves (Eus), como o Self ou "Eu Individual", e o Self ou "Eu pessoal", jamais devem ser pronunciados ou escritos sem seus adjetivos qualificativos e característicos.

Neste excelente escrito sobre o "Eu Supremo", este termo se aplica ao sexto princípio ou Buddhi (em união com manas, já que sem essa união não haveria princípio ou elemento pensante na alma espiritual); e isto tem dado lugar a erros. A declaração que "uma criança não adquire seu sexto princípio -logo, não se converte em um ser moralmente responsável, capaz de engendrar Karma — até a idade de sete anos", prova o que se quis dizer com a expressão "Higher Self" (Eu Supremo). O autor fica, portanto, perfeitamente justificado quando explica que depois que o Eu Supremo encarna no ser humano e impregna a personalidade (nos seres mais refinados), com sua consciência, "as pessoas dotadas de faculdades psíquicas podem perceber esse Eu Supremo de vez em quando, por meio de seus sentidos internos mais delicados". Mas também ficam "justificados" os que não o compreendem porque limitam o termo de "Eu Supremo" ao Princípio Divino Universal. Porque sem estar bem preparado para esta confusão de termos metafísicos[4],  quando lemos que enquanto "o Eu Supremo se manifesta completamente no plano físico, continua sendo um Ego espiritual consciente no plano correspondente da natureza" — inclinando-nos a ver no Eu Supremo dessa frase a "Atmã"; e a manas, ou melhor, a Buddhi-manas, no citado "Ego espiritual". Como conseqüência, podemos tachar todo ele de incorreto.

Para evitar tais erros daqui para a frente, minha idéia é traduzir literalmente os equivalentes dos termos ocultos orientais e propor o seu emprego.

O "princípio" restante: Prana, ou a "Vida", estritamente falando é a força radiante ou energia de Atmã — considerado como a Vida Universal e Eu Único —, seu aspecto inferior, ou, dizendo melhor, mais físico em seus efeitos, porque é seu aspecto manifestado, Prana ou a Vida, interpenetra o ser inteiro do universo objetivo; e é chamado "princípio" somente por que é um fator indispensável, é o deus ex machina do homem vivo.

 

O EU SUPREMO éAtmã, o raio inseparável do Eu Uno e Universal. É o Deus que está por cima melhor que dentro de nós. Feliz o homem que consegue impregnar dele seu Ego interno!
O Ego Espiritual divino éa alma Espiritual, ou Buddhi, intimamente unida com manas, o princípio da mente, sem o qual não é Ego algum, e sim puramente o veículo átmico.
O Ego Interno ou Eu Superior émanas, o "quinto" princípio, assim chamado independentemente de Buddhi. O princípio da mente só é o Ego Espiritual quando se fez um com Buddhi; e não se supõe que nenhum materialista possua semelhante Ego, por maiores que sejam suas capacidades intelectuais. É a Individualidade permanente, o "Ego que se reencarna".
O Ego Inferior ou Eu Pessoal éo homem físico em união com seu inferior, isto é, os instintos animais, as paixões, os desejos etc. É chamado "falsa personalidade", e compõe-se de manás inferior combinado com Kama-rupa, que age por meio do corpo físico e seu fantasma, ou duplo.

 

P: Creio que esta divisão simplificada em suas combinações responderá melhor à idéia; a outra é demasiado metafísica.

T: Se tanto os profanos como os teósofos quiserem aceitá-la, certamente será muito mais fácil de compreender.



[1] Transcrições da London Lodge da Sociedade Teosófica, número 7, outubro 1885.

[2] O "Ego que se reencarna", ou alma humana, como ele o chamava (o Corpo Causal para os vedantinos).

[3] A duração desta "transferência" sem dúvida depende do grau de espiritualidade da ex-personalidade do Ego desencarnado. Para aqueles cujas vidas foram muito espirituais, essa transferência, embora gradual, é muito rápida. A duração é maior para aqueles por demais inclinados à matéria.

[4] "Confusão de termos metafísicos" aplica-se aqui unicamente na mudança de equivalentes traduzidos das expressões orientais; até o momento jamais existiram termos semelhantes em inglês, razão pela qual cada teósofo teve que criar seus próprios termos para expressar sua idéia. É .tempo, portanto, de fixar-se uma nomenclatura definitiva.

 

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