O que a Sociedade Teosófica moderna não é

Enviado por Estante Virtual em dom, 02/12/2012 - 03:34

P: Portanto, não são essas doutrinas um renascimento do Buddhismo nem estão decalcadas na Teosofia neoplatônica?

T: Não. Mas o melhor meio de contestar suas perguntas é citando um apontamento sobre a "Teosofia", lido na Convenção Teosófica em Chicago (abril, 1889), pelo dr. J.D.Buck, M.S.T.

Nenhum teósofo se expressou ou compreendeu melhor a verdadeira essência da Teosofia, do que o fez nosso estimado amigo dr. Buck:

"A Sociedade Teosófica foi fundada com a finalidade de difundir as doutrinas teosóficas e promover e favorecer a vida teosófica. Não é esta Sociedade a primeira com este intento. Tenho em meu poder uma obra intitulada: Transações Teosóficas da Sociedade Filadélfica, publicada em Londres no ano de 1697; e outra chamada: Introdução à Teosofia, ou seja, a Ciência do Mistério de Cristo, quer dizer, da Divindade, Natureza e Criatura, compreendendo a filosofia de todos os poderes em ação, na vida, mágicos e espirituais, formando um guia prático para a pureza e santidade mais sublimes, e a perfeição evangélica para adquirir a visão divina e as santas artes angélicas, poderes e outras prerrogativas da regeneração", publicada em Londres em 1855, com a seguinte dedicatória: “Aos estudantes das universidades, colégios e escolas da cristandade; aos professores de ciências metafísicas, mecânicas e naturais em todas as suas formas; aos homens e mulheres do magistério da fé fundamental ortodoxa; aos deístas, arrianos, swedenborgianos e demais credos imperfeitos e mal fundamentados, racionalistas e céticos de qualquer espécie; aos maometanos, judeus e patriarcas orientais versados e de julgamento reto; mas especialmente ao ministro e missionário evangélico, tanto os dos povos bárbaros como os intelectuais, é humilde e afetuosamente dedicada esta introdução à Teosofia ou ciência dos princípios e mistérios de todas as coisas”.

No ano seguinte (1856), publicou-se outro livro de seiscentas páginas: Miscelâneas Teosóficas. Esta obra teve apenas quinhentos exemplares, destinados à distribuição gratuita em bibliotecas e universidades. Esses movimentos primitivos foram numerosos e nasciam dentro da Igreja, com pessoas de grande piedade, zelo e reputação inatacáveis. Todos aqueles escritos revestiam forma ortodoxa, usando expressões cristãs, e, como as obras do eminente eclesiástico William-Law, só se distinguem para o leitor comum, por sua enorme piedade e sinceridade. Todos, sem exceção, tentavam unicamente fixar a origem, explicar o sentido mais profundo e o valor original das Escrituras cristãs e expor e estimular a vida teosófica. Logo essas obras foram esquecidas e hoje em dia são geralmente desconhecidas. Tentaram reformar o clero e reavivar a verdadeira piedade, e sempre foram mal recebidas. Uma só palavra: "heresia", jogava-as no esquecimento como a todas as utopias semelhantes. Na época da Reforma, João Reuchlin tentou o mesmo objetivo sem resultado, apesar de ser amigo íntimo e confidente de Lutero. A ortodoxia jamais quis ser ilustrada.

Sempre se disse a esses reformadores — como ocorreu com Paulo Festus — que a instrução demasiada tornara-os loucos, e que seria perigoso seguir adiante. Apesar da verbosidade que nesses escritores era devida em parte ao costume, à educação, e também ao freio do poder secular, e, voltando à questão principal, pode-se dizer que esses escritores eram teosóficos no seu mais rigoroso sentido, e só se referem ao conhecimento do homem sobre sua própria natureza e à vida superior da alma. O presente movimento teosófico tem sido acusado algumas vezes de tentar converter o Cristianismo ao Buddhismo, o que significa simplesmente que a palavra "heresia" perdeu sua força e renunciou ao seu poder.

Em todas as épocas existiram indivíduos que compreenderam mais ou menos claramente as doutrinas teosóficas e as aplicaram em sua vida particular. Essas doutrinas não pertencem exclusivamente a religião alguma, e não estão relacionadas de modo especial a nenhuma sociedade ou época. São privilégio de toda alma humana. A ortodoxia deve ser interpretada por cada um segundo sua natureza, de acordo com suas necessidades peculiares e sua própria experiência. Isto vai explicar por que aqueles que imaginam ver na Teosofia uma nova religião, buscam em vão seu credo e seu ritual. A lealdade à verdade é seu credo e "honrar cada verdade por seus atos seu ritual". As massas compreendem muito pouco esse princípio de fraternidade universal, e raras vezes reconhecem sua importância transcendental. Provam-no a diversidade de opiniões e falsas interpretações sobre a Sociedade Teosófica. Esta Sociedade foi organizada sob o princípio único da fraternidade essencial do homem, como acabo de demonstrar ainda que breve e imperfeitamente. Tem sido atacada porque a consideravam buddhista e anticristã, como se se pudesse ser as duas coisas a um só tempo, precisamente quando ambos — o Buddhismo e o Cristianismo —, conforme foram estabelecidos por seus inspirados fundadores, consideram a fraternidade como o ponto essencial e único da doutrina e da vida. Também consideraram a Teosofia como uma coisa nova no mundo, ou tudo como um antigo misticismo disfarçado com um novo nome. Embora sendo verdade que muitas sociedades fundadas nos princípios de altruísmo ou fraternidade essencial, e unidas para defender esses princípios, tiveram vários nomes, não é menos certo que muitas delas foram também chamadas teosóficas, e seus princípios e objetivos eram os mesmos desta atual Sociedade que tem este nome. Em todas essas sociedades, a essência da doutrina foi sempre a mesma, e tudo o mais incidental, embora seja falo que muitas pessoas se fixem no acidental e descuidem o essencial".

Não é possível contestar melhor e mais explicitamente suas perguntas, do que como o faz um homem que é um de nossos mais apreciados e sinceros teósofos.

 

P: Sendo assim, qual o sistema que adotam além da ética buddhista?

T: Nenhum e todos. Não estamos ligados a qualquer religião ou filosofia especial: escolhemos o bom que em cada uma encontramos. Mas é necessário que se repita aqui que a Teosofia, como todos os sistemas antigos, está dividida em duas partes: a Exotérica e a Esotérica.

 

P: Em que consiste a diferença?

T: Em geral os membros da Sociedade Teosófica podem professar a religião ou a filosofia que acharem mais conveniente, sempre que simpatizem com um ou mais dos três objetivos da associação e estejam dispostos a defendê-los. A Sociedade é uma corporação filantrópica e científica para a propagação da idéia de fraternidade no terreno prático e não no teórico. Não importa que os membros sejam cristãos ou muçulmanos, judeus ou zoroastristas, buddhistas ou brâmanes, espiritualistas ou materialistas; mas cada membro tem que ser um filantropo, ou um estudante investigador da literatura ariana e outras antigas, ou dedicar-se às ciências psíquicas. Numa só palavra, deve contribuir, se possível, à realização de um dos objetivos do programa, pelo menos. De outra maneira, ingressar como "membro" não teria razão de ser. Assim é a maioria da Sociedade Exotéríca, formada por membros "ligados" e "independentes"[1]. Estes podem chegar a ser teósofos de fato ou não. São membros por pertencerem à Sociedade, mas esta não pode converter em teósofo a uma pessoa que não tem o sentido das coisas divinas, ou que aprecia as coisas da Teosofia de uma maneira muito particular -- (sectária, se é que se pode usar essa expressão — ou egoísta). O ditado: "generoso é quem faz generosamente" pode parafrasear este caso, e diríamos: "É Teósofo todo aquele que vive e pratica a Teosofia".



[1] "Membro ligado" é o que faz parte de uma Rama da S.T.; e "membro independente" é o que pertence à S.T., tem seu diploma expedido pela sede central (Adyar, Madras), mas não está filiado a nenhuma Rama ou Grupo.

 

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