Às vezes é possível aos membros do grupo de auxiliares evitar catástrofes iminentes de caráter um tanto mais importante. Em mais de um caso, quando o comandante de um navio tem sido levado inconscientemente para fora do seu curso por qualquer corrente desconhecida ou por qualquer erro nos cálculos, correndo com isso um risco qualquer, tem sido possível evitar um naufrágio impressionando-lhe repetidamente no espírito uma sensação de que qualquer coisa não está bem, e, ainda que isto pareça em geral no cérebro do comandante apenas como uma intuição avisadora, em todo o caso, quando é muito repetida, é quase certo ele acabar por lhe prestar alguma atenção e tomar as precauções que lhe pareçam convenientes.
Em um caso, por exemplo, em que o patrão de uma barca estava muito mais perto da costa do que supunha, repetidamente se lhe surgeriu que lançasse a sonda e ainda que resistisse a esta sugestão durante algum tempo, por lhe parecer desnecessária e absurda, acabou por dar a ordem numa voz um pouco hesitante. O resultado sobressaltou-o, e ele imediatamente se fez mais ao largo, ainda que foi só de manhã que pôde compreender quão próximo esteve de um desastre iminente.
Muitas vezes, porém, uma catástrofe é cármica de sua natureza, e não pode portanto ser evitada; mas não se deve julgar que, por isso, não se pode prestar nenhum auxilio. Pode bem ser que as pessoas de que se trate sejam destinadas a morrer neste momento não havendo portanto possibilidade de as salvar da morte; mas em muitos casos sempre será possível prepará-las para ela, assim como auxiliá-las, mortas já, no além-mundo. De resto, pode afirmar-se que, sempre que uma catástrofe de qualquer espécie se dá, dá-se também uma especial missão de auxílio.
Dois casos recentes em que se prestou esse auxílio foram o naufrágio do Drumond Castle ao pé do cabo de Ushant, e o terrível ciclone que devastou a cidade de S. Luís, na América. Em ambos estes casos foi dado um aviso de alguns minutos, e os auxiliares fizeram quanto puderam para acalmar e levantar os espíritos dos indivíduos, de modo que, quando o choque viesse, os perturbasse menos do que seria de esperar. Como é natural, porém, a maior parte do trabalho feito com as vítimas em ambas estas calamidades realizou-se no plano astral depois deles terem abandonado os corpos físicos; mas disto mais adiante falaremos.
É triste relatar quantas vezes, quando uma catástrofe está iminente, os auxiliares são perturbados nos seus trabalhos de bondade pelo pânico entre aqueles que o perigo ameaça — ou, às vezes, o que é pior, por uma louca explosão de bebedeiras entre aqueles a quem pretendem socorrer. Há muitos navios que têm ido para o fundo com quase toda a gente a bordo bêbeda a cair, e portanto inteiramente incapaz de aproveitar qualquer auxílio oferecido, quer antes da morte, quer durante bastante tempo depois.
Se alguma vez nos acontecer encontrarmo-nos numa situação de perigo iminente que não podemos evitar, devemos tentar compenetrar-nos de que o auxílio está com certeza perto de nós, e que de nós, e só de nós, depende tornarmos fácil ou difícil o trabalho do auxiliar. Se encararmos o perigo com calma e coragem, cônscios de que o verdadeiro Eu de modo algum pode por ele ser afetado, os nossos espíritos estarão então aptos a receber o auxílio que os auxiliares estão tentando dar-nos; e isto não pode senão ser o melhor possível para nós, quer o fim desse auxílio seja salvar-nos da morte, quer seja, quando isso é impossível, apenas fazer-nos atravessá-la tranqüilamente.
O auxílio desta última espécie tem sido dado muitas vezes em caso de desastres acontecidos a indivíduos, assim como em catástrofes mais gerais. Bastará que demos um exemplo, para ilustrar o que queremos dizer. Em um dos grandes temporais, que tantos estragos fizeram há anos nas nossas costas, aconteceu que um barco de pesca virou longe da terra. Os únicos tripulantes eram um velho pescador e um menino, e o primeiro conseguiu agarrar-se durante alguns minutos ao barco virado. Não havia auxílio físico próximo, e, mesmo que houvesse, teria sido impossível, num temporal daqueles, prestá-lo; de modo que o pescador sabia perfeitamente que não havia esperanças de salvação, e que a morte era apenas questão de momentos. Sentiu um grande terror ao ver isto, impressionando-o sobretudo a terrível solidão daquela vasta extensão marítima; também o apoquentaram muito idéias da sua mulher e da sua família, que ficariam na miséria com a sua morte repentina.
Uma auxiliar que passava, vendo isto, tentou animá-lo, mas, reparando que o seu espírito estava perturbado demais para que fosse possível sugestioná-lo, achou melhor mostrar-se-lhe para melhor poder prestar-lhe auxílio. Ao contar o caso depois, ela disse que a mudança fisionômica do pescador ao vê-la foi extraordinária e muito bela; com a forma luminosa sobre o barco a que se agarrava, ele não podia deixar de crer que um anjo o tinha vindo animar no seu perigo, e por isso sentiu que não só atravessaria incólume as portas da morte, mas também que a sua família receberia auxílio de alguém. Por isso quando, momentos depois, a morte veio ter com ele, o seu estado de espírito era muito diverso da perplexidade e do terror que antes o avassalavam; e, como é natural, quando retomou consciência no plano astral e viu que o "anjo" continuava a seu lado, sentiu-se à vontade ao lado dela, e pronto a aceitar os seus conselhos com respeito à vida nova em que tinha ingressado.
Tempos depois, esta mesma auxiliar prestou um outro serviço de ordem muito parecida, que relatou depois, como segue:
"Devem lembrar-se daquele vapor que foi ao fundo com o ciclone de 15 de novembro passado. Transportei-me até ao camarote onde estavam fechadas uma dúzia de mulheres e as encontrei a lamentar-se do modo mais triste, chorando e gritando de terror. O navio tinha de ir ao fundo — não havia auxílio possível — e sair do mundo neste estado de terror louco é a pior maneira de entrar no outro. De modo que, para as acalmar, materializei-me, e está claro que as pobres criaturas julgaram que eu era um anjo; caíram de joelhos, pedindo que as salvasse, e uma pobre mãe estendeu-me o filhinho pedindo-me que ao menos -o pusesse a salvo. À medida que falávamos, não tardou que elas se tornassem calmas, a criancinha adormeceu, e daí a pouco dormiam todas e eu enchi-lhes o espírito de pensamentos do mundo celestial, de modo que não acordaram quando o navio deu o mergulho final. Desci com elas para me as segurar que dormissem até ao fim e elas não se mexeram ao passarem do sono para a morte."
Evidentemente, que neste caso, também, os auxiliados não só tiveram a enorme vantagem de poder encontrar a morte com calma e segurança mas a vantagem, ainda maior, de serem recebidos na outra margem por alguém que já estava disposto a amar e crer — alguém que compreendia inteiramente esse novo mundo em que se encontravam, e não só lhes podia assegurar que estavam salvos, mas também aconselhá-los como orientar as suas vidas nessas circunstâncias tão diferentes. E isto leva-nos a considerar uma das seções maiores e mais importantes do trabalho dos auxiliares invisíveis — o auxílio e os conselhos que podem dar aos mortos.